
Desfecho é fruto de recurso da família do jovem Sadraque Muni Martins, de 24 anos, morto em agosto de 2023, à PGJ, após arquivamento do caso pela Promotoria de Votuporanga.
A PGJ (Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo) manteve a decisão do promotor de justiça votuporanguense, José Vieira da Costa Neto, que determinou o arquivamento do inquérito policial instaurado para apurar o crime de homicídio culposo no trânsito, contra o motorista de 21 anos que atropelou e matou o jovem Sadraque Muni Martins, de 24 anos, na madrugada do dia 6 agosto de 2023, na Avenida João Gonçalves Leite – tradicional Avenida do Assary.
A decisão da PGJ foi tomada após análise do recurso impetrado pela defesa da família de Sadraque, inconformada com arquivamento em Votuporanga; contudo, o órgão, que faz o controle e revisão dos atos realizados pelo Ministério Público, entendeu que a decisão foi assertiva.
Relembre o caso
Conforme amplamente noticiado pela imprensa, a morte de Sadraque foi causada por um atropelamento ocorrido na madrugada daquele domingo. De acordo com os registros policiais, a vítima estaria na Avenida do Assary, nas proximidades de um serv-festas, quando foi atingida por um carro VW/Gol, de cor preta, conduzido por D.D.S.Z., que é filho de um de um perito criminal aposentado e, por isso, a credibilidade das apurações da Polícia Civil chegou a ser questionada nas redes sociais; inclusive, gerando ampla repercussão sobre classes sociais e apontamentos de que por se tratar de filho de ‘policial’ qualquer ato ficaria impune.
Sadraque foi socorrido em estado grave, encaminhado para a Santa Casa de Votuporanga, sendo posteriormente transferido para o Hospital de Base de São José do Rio Preto/SP, onde ficou sob cuidados médicos até a declaração da morte encefálica. A família autorizou a doação de órgãos.
A situação gerou incômodo na própria corporação que por meio do Delegado de Polícia, Dr. Marco Aurélio da Silva Tirapelli, reiterou a lisura dos trabalhos de investigação que estava em curso.
Entre as principais dúvidas levantadas à época, questionavam a possível presença de álcool no organismo de Sadraque, o que foi descartado por exames. No entanto, no tocante ao motorista não consta resultado de exame.
Por fim, o relatório final do inquérito assinado pelo Delegado de Polícia, Dr. Thiago da Silva Pereira, concluiu pelo indiciamento de D.D.S.Z., pelos crimes de homicídio culposo no trânsito (quando uma pessoa mata a outra, sem intenção de matar, por meio de uma ação ou omissão negligente, imprudente ou imperita), além de fuga do local dos fatos.
Arquivamento no Ministério Público e indignação
Ao analisar o inquérito, o promotor responsável pelo caso, José Vieira da Costa Neto, afirmou que não foram angariados elementos ao processo capazes de evidenciar a prática de alguma conduta culposa do acusado de modo a dar causa ao acidente.
“No ponto, cumpre observar que não se pôde constatar de que maneira a vítima tomou o centro da via pública, onde foi atingida pelo veículo do investigado, notadamente porque não havia no local do acidente faixa de pedestre que pudesse indicar que Sadraque transpunha a rua de maneira regular. Assim, não há elementos que indiquem quebra do dever de cuidado do investigado, a evidenciar que tenha agido de maneira imprudente, negligente ou imperita. Lamentavelmente, a tomada do meio da via pública pela vítima parece ter se dado de maneira irregular e objetivamente imprevisível, o que afasta a conduta culposa por parte do investigado e dá indícios de culpa exclusiva da vítima para o atropelamento e evento morte”, manifestou em decisão do Ministério Público.
A decisão gerou indignação na família de Sadraque, e assim que foi divulgada, os advogados Hery Kattwinkel e Felipe Derossi vieram a público para dizer que iriam lutar para que o caso tivesse andamento e fosse a julgamento: “A família recebeu com indignação a notícia do arquivamento. O que estamos vendo aqui é uma tremenda injustiça, pois estamos falando de um filho perdido e de uma mãe que até hoje chora por um filho morto e a pessoa que matou o seu filho não será processada pela justiça criminal. A gente só quer que o processo seja recebido e lá na frente à justiça julgue se é caso de homicídio ou não”, defendeu Hery Kattwinkel, durante coletiva de imprensa, no dia 19 de dezembro de 2024.
“A própria investigação da Polícia Civil que esteve lá, fez o trabalho, teve contato com as provas, aponta que não tem sinais de frenagem ou derrapagem no local do acidente. Ademais, vai lá ver o tamanho do resultado do atropelamento no carro, o que evidência, talvez aí, como se estivesse em alta velocidade, até porque a marca que está no carro é gigantesca e o corpo foi arremessado a vários metros de distância. Mas vamos pelo laudo que diz que a ausência de marcas de frenagem pode decorrer de diversos fatores, como velocidade excessiva, ausência de reação, tempo de percepção tardia. Pois bem, o que causa no motorista percepção tardia? É uma pergunta. O que causa ausência de reação no motorista? O que causa, talvez, uma velocidade excessiva? Ali havia um serv festas e muitas pessoas estavam no local, todo mundo sabe que a Avenida do Assary tem muita gente frequentando, logo, nós temos que ter o que? Cautela. E você nem freia para poder atropelar uma pessoa? Olha como ficou o carro e nós não podemos apurar isso? O juiz não pode ter acesso a essas provas? Vamos matar no ninho? Por quê? Qual o motivo disso?”, emendou Hery Kattwinkel.
“E agora, o que é que eu vou falar para a mãe do Sadraque, que já perdeu o filho e agora precisará lidar também com essa injustiça? Isso não pode ficar assim, vamos até a última instância necessária para que seja feita Justiça. O que essa mãe quer é Justiça. Nada vai trazer o filho dela de volta, mas o que eu digo a ela dessa sensação de Justiça? Primeiro perde o filho desta forma e depois esse desfecho, essa mãe nunca mais terá paz. Então, nessa busca por Justiça nós estamos peticionando a Procuradoria-Geral de Justiça, a Corregedoria do Ministério Público e o Conselho Nacional de Justiça”, encerrou o advogado.
Revisão da PGJ
Diante do quadro, a família apelou à Procuradoria-Geral de Justiça, que funciona como uma espécie de “segunda instância” do Ministério Público, solicitando uma revisão do caso. No entanto, ao analisar o inquérito, o Procurador Geral da Justiça, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, corroborou a decisão do Órgão em Votuporanga.
“Não há que se falar em ilegalidade ou teratologia na promoção do arquivamento, senão em inconformismo dos representantes da vítima com a conclusão lançada pelo zeloso representante do Ministério Público, desprovido de fundamentação capaz de afetar os seus fundamentos de fato e de direito”, diz trecho da decisão.
“Como bem ponderou o diligente Promotor de Justiça, não há como se presumir que o investigado estivesse conduzindo o seu veículo em alta velocidade pelo local, até mesmo porque, como bem ressaltado, restou evidente que a vítima, ao tentar atravessar a via pública, interceptou a trajetória do auto conduzido pelo investigado, oportunidade em que ocorreu o atropelamento”, concluiu o Procurador, mantendo o arquivamento do inquérito.