Usa celular no vaso? Isso pode ser mais perigoso do que parece; entenda 

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Imagem ilustrativa de uma personagem usando o celular no banheiro — Foto: Miriam Alonso/Reprodução

Embora pareça inofensivo, o hábito pode causar hemorroidas, dores posturais e até dependência psicológica; entenda os riscos.


Ficar longos minutos sentado no vaso com o celular na mão, rolando o feed do Instagram ou respondendo mensagens no WhatsApp, pode parecer um hábito inofensivo — mas não é. A prática recorrente pode causar problemas como hemorroidas (principalmente em quem já tem predisposição), constipação intestinal, desequilíbrios na microbiota, dores posturais e até dependência emocional. Esse comportamento, cada vez mais comum, é um reflexo direto do nosso estilo de vida hiperconectado e, apesar de parecer banal, pode comprometer a saúde física e mental ao longo do tempo.

A reportagem ouviu especialistas e analisou estudos que revelam como o uso prolongado do celular no vaso pode interferir no reflexo evacuatório, sobrecarregar o sistema digestivo e afetar o bem-estar psicológico. A seguir, entenda os riscos por trás desse hábito, o que dizem medicina e psicologia, e como pequenas mudanças podem fazer grande diferença na sua saúde.

Uso de celular no vaso: veja o índice completo

A reportagem reuniu seis coisas que você precisa saber sobre o uso de celular no vaso sanitário na lista abaixo. A seguir, confira os tópicos que serão abordados neste guia.

1 – O hábito é comum? 

2 – O que acontece com o corpo quando ficamos tempo demais no vaso? 

3 – Pode afetar o intestino mesmo sem dor? 

4 – O que dizem os especialistas? 

5 – Há soluções simples? 

6 – Outros problemas relacionados ao uso excessivo do celular 

O hábito é comum? 

Estudos mostram que o uso do celular no banheiro é uma prática quase universal. Uma pesquisa global da NordVPN de 2022 revelou que 65% dos adultos usam o celular no banheiro — em Hong Kong, esse número sobe para 90%. O que antes era reservado às revistas e jornais, hoje foi substituído por vídeos, redes sociais e jogos que estendem a permanência no vaso muito além do necessário. Em muitos casos, o tempo que poderia ser de 2 a 5 minutos ultrapassa facilmente os 15. 

No X, o antigo Twitter, o tema é abordado com o bom humor característico dos brasileiros que ironizam a situação. Frases como “eu tenho q parar de usar celular sentado no vaso sanitário pq perco a hora” ou “se você está lendo isso no trono… já sabe o que (não) fazer” se destacam na rede social. Contudo, apesar do tom de brincadeira, a prática tem consequências reais. A Dra. Roshini Raj, gastroenterologista da NYU Langone, alerta: “Mesmo que você não esteja forçando, só o fato de estar sentado por muito tempo ali já aumenta a pressão sobre as veias retais”. 

O que acontece com o corpo quando ficamos tempo demais no vaso? 

A posição sentada prolongada no vaso — especialmente com o tronco inclinado e o celular na mão — provoca uma sobrecarga na região do reto e do ânus. Segundo a fisioterapeuta, Dra. Luana Antunes, essa prática: “pode impactar de forma significativa. O assoalho pélvico é uma região composta por músculos e ligamentos que sustentam órgãos como bexiga, reto e útero, além de participar do controle da urina e das fezes”. 

Essa pressão contínua facilita o surgimento de hemorróidas, que são veias dilatadas e inflamadas nessa região. A Dra. Marcella Sousa, coloproctologista da Santa Casa de São Paulo, explica: “Quando você se distrai com o celular, acaba ficando mais tempo no vaso sem perceber, e essa distração pode fazer com que você faça força sem necessidade, o que sobrecarrega a região anal.” 

Além das hemorroidas, essa postura inadequada afeta diretamente os músculos do assoalho pélvico — responsáveis por controlar o funcionamento do intestino e da bexiga. O esforço inconsciente pode causar fissuras anais e até favorecer quadros de prolapso retal, nos casos mais graves. Segundo a médica, ficar além dos 10 minutos já é considerado um fator de risco: “o ideal é que você só fique no vaso o tempo necessário para evacuar — nada de passar ali lendo ou rolando o feed por longos minutos”. 

Pode afetar o intestino mesmo sem dor? 

Mesmo sem sinais imediatos de dor, o hábito pode alterar o funcionamento intestinal. O uso constante do celular enquanto se tenta evacuar pode romper a conexão entre cérebro e corpo, dificultando a percepção do momento certo de fazer força ou relaxar. Isso pode resultar em constipação, evacuações incompletas e até dependência de estímulos externos — como o celular, por exemplo — para conseguir ir ao banheiro. O problema, segundo especialistas, é que a pessoa acostuma o corpo a “esperar” o momento errado. 

De acordo com a Dra. Marcella, “se você começar a perceber sangue no papel higiênico, dor ou coceira ao evacuar, sensação de que não conseguiu esvaziar tudo ou até sentir algo ‘saindo’ pelo ânus, é hora de ligar o sinal de alerta”. Esses são sinais clássicos de que algo não vai bem. Ainda que o aparelho digestivo continue funcionando, ele pode passar por uma “reprogramação” ruim, em que o estímulo natural de evacuação perde força por conta da constante distração digital. 

O que dizem os especialistas 

A psicóloga clínica e neuropsicóloga Joyce Botte, especialista em análise do comportamento, afirma que o problema vai além da fisiologia e revela um desequilíbrio emocional crescente. “As pessoas estão tendo muita dificuldade para lidar com o seu ócio. Ou até muita dificuldade para lidar com seus momentos de autocuidado”, diz. 

A especialista explica que o celular tem substituído atividades simples como dormir, comer e até tomar banho de maneira consciente — e o banheiro virou mais um espaço afetado por esse condicionamento. Para Joyce, “o hábito de estar com o celular sempre pode sim prejudicar a saúde física”. O que pode ser observado na fala da Dra. Luana Antunes, que diz: “Quando estamos com o celular na mão, costumamos adotar posturas inadequadas: pescoço inclinado para frente, ombros tencionados, coluna curvada. Isso gera uma sobrecarga adicional não só na região pélvica, mas também na lombar e cervical.” 

A psicóloga ainda alerta que usar o celular no banheiro não é apenas uma distração, mas um comportamento aprendido e reforçado socialmente, difícil de reverter. Reverter esse padrão, segundo ela, exige autoconhecimento e rotina: “O uso do celular é um estimulador cognitivo, um estimulador cerebral, um estimulador psicológico. Então a pessoa fica lá, e fica horas e horas, mas quando a pessoa fica horas e horas no uso do celular ela acaba se colocando de lado.” 

Há soluções simples? 

A boa notícia é que dá para mudar esse hábito com pequenas atitudes. A primeira delas é deixar o celular fora do banheiro — fora da vista e, principalmente, fora da mão. Também vale adotar um limite de tempo: Dra. Marcella Sousa recomenda não passar mais de 5 a 10 minutos no vaso sanitário. Para quem quiser um estímulo visual, vale usar um cronômetro ou até apps que bloqueiam o celular por alguns minutos. Vale destacar que o problema não é o celular em si, mas o tempo prolongado e a postura inadequada. 

Outra dica importante é o uso de banquinhos de apoio para os pés, que ajudam a alinhar o ângulo do cólon e facilitam a evacuação sem esforço. Além disso, criar um ambiente mais calmo, silencioso e livre de distrações ajuda o corpo a manter o ritmo intestinal natural. Como reforça a psicóloga Joyce Botte, “é preciso entender o seu momento de ócio, e não preenchê-lo automaticamente com tecnologia”. Estar presente até nos momentos mais rotineiros pode ser um grande passo em direção à saúde e ao equilíbrio.

  • Evite usar o celular no vaso por mais de 5 minutos;
  • Use um banquinho para apoiar os pés, atingindo o ângulo do cólon e facilitando a evacuação;
  • Crie um ambiente que estimule o foco na evacuação;
  • Use aplicativos com limite de uso ou lembrete de tempo;
  • Entenda que o problema não é o celular em si, mas o tempo e a postura.

Outros problemas relacionados ao uso excessivo do celular

Além dos impactos no sistema digestivo, o uso excessivo do celular — inclusive no banheiro — está associado a uma série de problemas físicos e de higiene. Um deles é a síndrome do pescoço de texto, provocada pela inclinação constante da cabeça ao olhar para a tela, o que sobrecarrega a coluna cervical e pode causar dores no pescoço, ombros e cabeça. Outro quadro comum é o chamado “dedo de celular“, ou tenossinovite, uma inflamação nos tendões dos dedos e punhos causada por movimentos repetitivos, como rolar o feed ou digitar por longos períodos. Ambas as condições vêm crescendo em consultórios médicos, especialmente entre adolescentes e adultos que passam muitas horas conectados. 

Há ainda um risco invisível: o celular pode acumular até 10 vezes mais bactérias do que a superfície de um vaso sanitário. Isso acontece porque o aparelho está em contato constante com mãos, rosto e superfícies sujas — e quando levado ao banheiro, a exposição a germes como E. coli, Salmonella e Staphylococcus aureus se intensifica. A falta de higienização do dispositivo contribui para a proliferação desses microrganismos, que podem causar infecções respiratórias e gastrointestinais, principalmente em crianças, idosos e pessoas imunossuprimidas. 

*Com informações do techtudo