A notícia caiu como uma bomba. Era uma tarde quente de terça-feira e o dia estava no seu curso normal. Foi chegando aos poucos e apertando os corações dos que, incrédulos, recebiam a informação de sua morte. Havia muito tempo que ele lutava contra a doença. Era um exemplo de resignação e coragem. Trazia nos olhos, apesar da enfermidade, a vivacidade que sempre encantava a todos. Já não era mais um jovem. A idade estava avançando, mesmo assim trazia uma força grande de se comunicar com a juventude de hoje, como fazia há tantos anos.
Portava sempre um sorriso de quem sabia o que queria da vida, e a voz de cantor que embalava os corações com canções em italiano, só as mais clássicas. Com o avanço da doença, começou a celebrar a missa na cadeira de rodas. Quem viu essa situação, no início, entristeceu, pois percebia que sua saúde não estava mais a mesma. Mas sua força e sua alegria eram tantas que a cadeira não causava mais estranheza, pelo contrário, transformou-se em um símbolo de resistência e de força de vontade para continuar a sua missão.
Era isso que mais se ouvia com a chegada da notícia de sua morte: “cumpriu a sua missão nesse mundo”. Foi um padre de muitas obras. Um visionário, que trazia uma coragem que poucos têm de empreender e inovar. Destemido, foi além dos jardins de sua igreja, alcançou o mundo. Amado por muitos, tinha também os que criticavam o seu jeito de ser. Mas, ele continuava. Afinal, a vida precisava ser vivida com intensidade e isso o padre sabia fazer bem.
Eu era criança quando ele assumiu como pastor da minha pequena comunidade. Deu-me a primeira comunhão e ensinou-nos canções novas que ainda povoam a minha memória. Uma delas, que ele cantava na época, dizia assim: “Tudo passa. É saber perder, é saber ganhar. Na vida, o que importa é amar”. E realmente tudo passa, padre Silvio. O senhor passou pelas nossas vidas com muita intensidade. Foi um cometa que cortou o céu da nossa existência e deixou o seu rastro luminoso para sempre em nossas vidas.
Será lembrado por tantas pessoas de tantos seguimentos da sociedade que, como numa grande colcha de retalhos, valeria a pena juntar algumas histórias sobre ele e colocá-las em um livro.
Na tarde do dia seguinte ao anúncio da sua morte, espalhou-se pela cidade que um caminhão carregado com coroas de flores saiu da igreja rumo ao cemitério. Havia terminado a missa de corpo presente, e a igreja de Santa Luzia ficou pequena para tantos corações entristecidos e agradecidos prestarem homenagens ao padre das noivas, das misses, dos motoqueiros, das canções, da RCC, dos jovens destruídos pelos vícios, das homilias encantadoras, daquele que mudou de cidade, mas nunca saiu da vida do povo deste lugar.
Era atuante nas redes sociais. Estava sempre se atualizando para nunca perder espaço no mundo moderno. Curtia fotos no instagram, desejava bom dia com fotos bonitas de algum lugar do mundo e sorria sempre. Deve ter sofrido também nos últimos tempos com as dores e os tratamentos que sempre passam os que lutam pela vida. Mas todos os que quiseram falar com ele, falaram. Todos que quiseram participar das suas missas, participaram. Todos que quiseram encontrá-lo para um abraço, uma foto, uma palavra, assim fizeram. Permaneceu disponível até o fim.
Dias antes de falecer postou nas redes sociais uma foto junto com um padre que faleceu na época da pandemia, com Covid, e escreveu: “Saudades do pe. Joaquim Tadeu”. Os dois com um sorriso lindo. Conhecendo-os bem, dá para imaginar que, quando se encontravam, saía dali muitas risadas e muitas conversas.
Hoje, dias depois dessa postagem, somos nós que escrevemos em nossas redes sociais: “Saudades dos padres Silvio e Joaquim Tadeu”. Saudades de vocês pelas histórias verdadeiras que viveram conosco. Por terem sido pastores em nosso meio e nos ensinarem que, dessa vida, não se leva nada além do bem que se faz.
Acreditamos que a vida é um tesouro e que pertencemos ao céu. Lá do alto, entre as nuvens de chuva e os raios de sol, vocês devem estar rindo alto de tantas histórias vividas com intensidade neste mundo de meu Deus.
Obrigado, padre Silvio Roberto. Cante e encante entre os anjos. Que Santa Luzia lhe dê um abraço por nós e que o Menino Jesus de Praga, padroeiro de sua última paróquia, pegue em sua mão e o leve para os jardins da eternidade. Ali, acreditamos, não tem mais dor, nem preconceitos, nem incompreensões. Ali, há apenas amor verdadeiro, como você sempre cantou para nós: “Passarão as profecias, e também todas as línguas. / A ciência um dia acabará, mas o amor nunca passará. / Porque tudo crê e tudo espera, tudo cobre, tudo sofre. / O próprio bem não procura, mas vibra só com a verdade”.
- Padre Djalma Lúcio Magalhães Tuniz – Pároco de Américo de Campos e Pontes Gestal