
A Prefeitura de Votuporanga entendeu a iniciativa como inconstitucional, “posto que viola o pacto federativo no tocante a repartição constitucional de competências”. Veto deve ser votado na Câmara.
O Projeto de Lei nº 114/2025, conhecido como “Lei Lurdinha”, aprovado por unanimidade durante a 39ª sessão ordinária da Câmara Municipal de Votuporanga/SP, do dia 3 de novembro, que buscava garantir atendimento prioritário a pessoas com câncer e transtornos severos, foi vetado integralmente pelo prefeito Jorge Seba (PSD). A decisão foi publicada no Diário Oficial Eletrônico do Município, na última sexta-feira (28).
A iniciativa, de autoria dos vereadores Natielle Gama (Podemos) e Ricardo Bozo (Republicanos), previa atendimento prioritário em todas as etapas nas unidades públicas de saúde para pessoas em tratamento oncológico, assim como indivíduos com transtornos graves do neurodesenvolvimento, como Transtorno do Espectro Autista (TEA) nível 3 de suporte, TDAH grave, TOD grave, e deficiência intelectual grave.
Na prática, a proposta aprovada na Câmara, segundo os proponentes, tinha a intenção de garantir acolhimento mais ágil e humanizado a pacientes com maior vulnerabilidade clínica e emocional.
O projeto determinava que a prioridade fosse concedida em todas as etapas do atendimento, não apenas na triagem. A comprovação da condição poderia ser feita mediante laudo, atestado, declaração médica, cartão de pessoa com deficiência ou carteira de acompanhamento emitida por unidade de oncologia reconhecida.
Segundo os autores, a iniciativa foi elaborada em parceria com entidades assistenciais que atendem esses públicos, como a Apae, o Recanto Tia Marlene e a Aadfav (Associação da Pessoa com Deficiência de Votuporanga).
Na justificativa do projeto, os vereadores destacaram que o tempo prolongado de espera nas unidades de saúde pode gerar crises emocionais e agravamento de quadros clínicos, além de expor pacientes oncológicos a maior risco de infecção durante o tratamento. A medida, segundo eles, está alinhada com os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), como equidade, integralidade e respeito à vulnerabilidade, sendo de fácil aplicação e baixo custo, mas com impacto social e humano significativo.
Contudo, o chefe do Poder Executivo, justificou na mensagem de veto, encaminhada à Casa de Leis, que fundamenta a decisão na inconstitucionalidade formal da proposta, apontando que a matéria trata de proteção e defesa da saúde e da integração social das pessoas com deficiência, temas inseridos na competência legislativa concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal.
“A despeito dos bons propósitos que motivaram a iniciativa, o projeto de lei nº 114/2025 é incompatível com a ordem constitucional vigente, posto que viola o pacto federativo no tocante a repartição constitucional de competências, nos termos dos artigos 24, XII e XIV, e 30, I e II, todos da Constituição Federal”, consta no texto.
Ainda na mensagem, a Prefeitura de Votuporanga salienta que, ao criar novas hipóteses de atendimento prioritário, o município teria invadido a competência normativa da União, contrariando entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal (STF). O texto ainda apresenta diversas decisões recentes de Tribunais de Justiça que declaram como inconstitucionais leis municipais semelhantes em outros municípios, por ampliarem o rol de beneficiários definido em normas federais.
O veto, que já foi lido durante expediente da Câmara, deve ser apreciado pelos vereadores em data agendada pelo presidente da Casa, vereador Daniel David (MDB). Na oportunidade, os parlamentares poderão acatar a decisão do prefeito Jorge Seba ou derrubá-la.
Caso o veto seja acatado, o projeto é arquivado. No entanto, se derrubado, a iniciativa retorna ao Paço Municipal para promulgação e publicação como lei municipal. Se a Prefeitura não sancionar, o texto volta para a Câmara, que irá fazer a promulgação por ato próprio.
Vale ressaltar que a Administração Municipal ainda pode recorrer ao Poder Judiciário caso mantenha o entendimento de inconstitucionalidade, sendo que, enquanto não houver decisão contrária, a norma entra em vigor na data de sua publicação, permitindo que a “Lei Lurdinha” seja implementada em Votuporanga.




