Educação no Brasil: Quando o Ritmo do Samba Encontra a Desarmonia do Sistema 

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Alberto Martins Cesário, professor e escritor - Foto: Reprodução

Alberto Martins Cesário, professor e escritor (@alberto.prof) 

É como diz o ditado popular: “Ensinar é um ato de amor.” No entanto, aqui no Brasil, a coisa não é tão simples assim. Ser professor no país das desigualdades é mais parecido com uma luta de boxe onde, por mais que a gente se esforce, muitas vezes os socos vêm de todos os lados. Os alunos, as famílias, a sociedade em geral e, principalmente, o sistema educacional, com suas leis e reformas que mais confundem do que ajudam. 

Mas quem disse que a vida de professor seria fácil? Na verdade, ela é cheia de altos e baixos, como uma boa composição de samba. Aquele ritmo contagiante, a energia que nos move todos os dias para dentro da sala de aula, mas que, em muitas ocasiões, encontra a falta de harmonia que deixa tudo meio torto. Mesmo assim, seguimos dançando, improvisando, fazendo o melhor que podemos com os instrumentos que temos. Porque, no fim das contas, é a nossa dedicação, a nossa paixão e, mais que tudo, a nossa missão que nos fazem continuar. 

É impossível falar da educação no Brasil sem encarar de frente as desigualdades que marcam o nosso sistema educacional. A educação pública, que deveria ser um pilar de transformação social, frequentemente se torna um campo de batalha. Se o ensino privado ainda tem sua fatia da fortuna, o público se arrasta com escassez de recursos, salas superlotadas, professores sobrecarregados e um sistema de avaliação que muitas vezes não reflete as reais necessidades dos alunos. 

A desvalorização do professor é a primeira nota desafinada desse samba. Em vez de sermos vistos como os verdadeiros protagonistas da mudança, somos tratados como meros coadjuvantes. O salário, que em muitas regiões é um prêmio de consolação, não condiz com o esforço que colocamos em cada aula, em cada planejamento, em cada abraço, em cada palavra de incentivo. A cada mês, é como se a educação fosse uma dança difícil, onde as pernas estão cansadas, mas ainda precisamos continuar o passo, porque é o que se espera de nós. 

Essa desvalorização é como um tropeço na dança. O governo nos pede para sermos artistas da educação, criadores de um futuro melhor, mas não nos oferece o palco nem as condições necessárias para brilhar. E, por mais que queiramos, às vezes, fica difícil manter a energia quando os instrumentos estão quebrados e o público está mais interessado no show do que na mensagem que tentamos passar. 

Mas o que o sistema não percebe, o que o governo e a sociedade parecem esquecer, é que o professor, apesar de tudo, é o verdadeiro herói dessa história, um guerreiro do cotidiano. Nós, professores, somos os protagonistas dessa luta diária. Cada dia na sala de aula é uma batalha que travamos por um país melhor. Não é apenas sobre ensinar matemática, português ou história. É sobre ensinar cidadania, respeito e solidariedade. É sobre mostrar aos alunos que, apesar das dificuldades que eles e suas famílias enfrentam, há um futuro de possibilidades esperando por eles, e esse futuro começa ali, dentro daquelas quatro paredes. 

Eu, como professor, sou testemunha de como a educação transforma o ambiente. Não é mágica, não é instantâneo, mas é um processo que, pouco a pouco, vai moldando os alunos, despertando a curiosidade, instigando o pensamento crítico. Um aluno que antes não sabia sequer que poderia sonhar com a faculdade, agora começa a entender que o caminho para lá é árduo, mas possível. A magia da educação acontece aos poucos, e cada pequena vitória em sala de aula é uma nota perfeita que nos impulsiona para o próximo acorde. 

E não importa quantas vezes o sistema nos decepciona ou nos faz questionar nossa escolha. O professor está ali, todos os dias, na linha de frente, lidando com alunos com realidades muito diferentes da sua, mas com um objetivo comum: proporcionar a cada um deles as ferramentas para se tornarem pessoas melhores e mais preparadas para a vida. E o que poucos sabem é que, enquanto a sociedade tece críticas, a verdadeira transformação acontece ali, no chão da escola, na relação de confiança e respeito que é construída entre professor e aluno. 

O sistema educacional brasileiro parece estar desconectado da realidade de quem está nas salas de aula. As políticas públicas de educação são como um samba desafinado, que não consegue encontrar o ritmo certo. O governo faz reformas atrás de reformas, cria novas diretrizes, troca ministros, e tudo isso sem ouvir de verdade aqueles que estão no campo de batalha: os professores. 

A falta de investimento nas escolas públicas é uma das maiores falhas. Imagine tentar tocar uma música complexa com instrumentos defeituosos. É isso que enfrentamos todos os dias. Salas de aula superlotadas, falta de materiais didáticos adequados, escolas em péssimas condições estruturais… E ainda assim, o professor é cobrado para ser o maestro dessa orquestra caótica. O pior é que, muitas vezes, esse maestro nem é ouvido. As políticas públicas estão mais interessadas em números e resultados rápidos do que em compreender as dificuldades reais do dia a dia. 

E não para por aí. A burocracia e a carga de trabalho excessiva também não ajudam. O professor não é apenas um educador. Somos gestores de sala de aula, psicólogos, assistentes sociais e, às vezes, até pais para nossos alunos. Os dias são longos, e a carga emocional é pesada. Mas o que realmente nos faz seguir é o amor pela profissão e a certeza de que estamos fazendo a diferença na vida de alguém, por mais que o sistema nos desvalorize. 

É difícil medir o impacto real de um professor. O verdadeiro valor da educação não aparece nos números frios de uma pesquisa, mas no olhar de um aluno que finalmente entendeu uma equação, na postura de um estudante que começa a questionar o mundo à sua volta, na criança que, pela primeira vez, encontrou seu talento em um livro. Cada aula, cada sorriso, cada palavra de encorajamento são as pequenas vitórias que, juntas, criam um futuro melhor. São conquistas invisíveis, onde a educação é a única ferramenta da transformação social. 

É nesses pequenos momentos que a verdadeira magia acontece. E isso é o que mantém os professores na luta, todos os dias. Porque sabemos que, apesar de todas as adversidades, estamos fazendo a diferença. A sala de aula não é só um lugar de aprendizado acadêmico, mas um espaço de transformação social. O Brasil não vai mudar de uma vez, mas, passo a passo, podemos contribuir para que ele melhore. O país precisa de mais professores, mais investimos na educação, mais recursos, mais valorização. 

E em época de carnaval, podemos dizer que nosso samba é a resistência e a esperança onde a educação é, sem dúvida, uma das maiores potências de transformação que temos. No entanto, para que ela se realize plenamente, precisamos que todos compreendam o verdadeiro papel do professor. Não somos heróis de capa, mas somos guerreiros que, dia após dia, ensinam e aprendem junto com nossos alunos. E, por mais que o sistema nos desafie, por mais que as dificuldades se acumulem, nós estamos ali. Porque acreditamos no poder da educação. 

A cada aula, a cada interação, a cada palavra de esperança, estamos, sem perceber, criando um futuro diferente. Somos professores, somos a esperança que pulsa nas escolas desse país, somos o samba que nunca perde o ritmo, mesmo diante da falta de harmonia. E, mesmo quando as notas não se encaixam perfeitamente, seguimos tocando, pois sabemos que a transformação que buscamos, tanto nas nossas salas de aula quanto na sociedade, começa com um passo de cada vez. 

Ser professor no Brasil é como fazer parte de um grande espetáculo, onde o público às vezes não nos aplaude, mas onde continuamos a dançar e a ensinar. Porque, no fim das contas, a verdadeira mudança só acontece quando acreditamos nela. E nós, professores, acreditamos. Sempre.