Partindo do pressuposto de que uma educação responsável deve, a um só tempo, ser responsiva aos usos das múltiplas linguagens, ou seja, a importância de mais uma língua para ampliação dos conhecimentos para a formação global do ser.
Em entrevista para o jornal Diário de Votuporanga a professora de inglês Mariana Guedes Seccato da escola Sesi e do colégio Celtas de Votuporanga pode falar sobre a importância da educação linguística responsiva para crianças, acompanhe:
DV: Qual a importância da educação linguística responsiva para crianças nas escolas?
“A presença da Língua Inglesa no nosso dia a dia é inegável, assim como sua importância em atividades cotidianas, desde fazer compras, compreender um texto até em atividades esportivas e lúdicas. Hoje em dia, o número de pessoas que falam inglês como língua adicional ultrapassa o número de falantes nativos do idioma. Pelo uso que dele fazemos em nossas vidas, no nosso cotidiano cultural, qualquer pessoa que revela um conhecimento básico da língua teria mais possibilidades de interagir e comunicar-se em vários contextos. Dessa forma, entendo a necessidade do seu aprendizado nas primeiras séries do ensino fundamental I. No entanto, advogo pela importância desse aprendizado, muito além da perspectiva instrumental ou linguística, que compreende a língua como uma commodity. Acredito na aprendizagem da Língua Inglesa como uma oportunidade de compreensão das diversidades, atrelando realidades locais às demandas globais.
Para tanto, discorro sobre a possiblidade de uma educação linguística responsiva para/com crianças, em que a Língua Inglesa, enquanto língua adicional, possa ser instrumento de socialização, compreensão do ‘outro’ e de agência social. Dessa forma, pontuo a necessidade de pontuar a essencial relação dialógica entre os indivíduos e o mundo a fim de desenvolver o pensamento crítico sobre linguagem e suas amplas e diversas formas de acontecimento e interpretação. Assim, recorro à necessidade de posicionamento e compreensão das inúmeras culturas e acredito que a educação multicultural pode ser uma das chaves para o desenvolvimento de conteúdos programáticos que representem a totalidade de possibilidades de atuações dos indivíduos que se encontram no processo educativo.
A discussão e inclusão de aspectos culturais nos conteúdos ampliam a possibilidade de abordagens em um programa educativo. Na proporção em que discutem o mundo da cultura, vão explicitando seu nível de consciência da realidade, no qual estão implícitos vários temas. Vão referindo-se a outros aspectos da realidade, que começa a ser descoberta em uma visão crescentemente crítica.
Embora a cultura seja muitas vezes definida e percebida pelas escolas como a celebração de pessoas importantes, religiões, tradições e feriados, assim como uma apreciação dos costumes de diferentes grupos, ela deve ser entendida como algo a mais. Ou seja, a cultura inclui as experiências cotidianas, pessoas, eventos, cheiros, sons e hábitos de comportamento que caracterizam os alunos e a vida dos educadores. Cultura molda o senso de quem ele ou ela é e onde ele ou ela se encaixa na família, comunidade e sociedade. Sua definição inclui três importantes elementos na descrição e compreensão da cultura: a cultura é adquirida, um indivíduo adquire cultura como um membro de uma determinada sociedade, e a cultura é uma interação complexa de elementos (concretos e abstratos). Pessoalmente retenho que a consideração que faz em estabelecer que a definição de cultura não pode ser constituída sem o entendimento das diversidades. Só é possível definir cultura reconhecendo a diversidade. A diversidade é o compromisso com o reconhecimento e apreciação da variedade de características que torna os indivíduos únicos em uma atmosfera que promove e celebra a realização individual e coletiva. A essência da diversidade se encontra nas instâncias de quem somos (raça, gênero, idade, etnia, religião, orientação sexual, aspectos físicos); o que aprendemos (bagagem educacional,
experiência profissional, crenças, situações familiares, origem geográfica, responsabilidades assumidas); como conduzimos a vida (aprendizagens, ensinos, aceitações, entendimentos, inovações, integridade) e como interagimos (responsabilidades, apreciações, respeito, empoderamento, trabalho em equipe, mudanças positivas, flexibilidade, oportunidades, inclusão, equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, comunidade, negócios). Dessa forma, a diversidade é importante porque em nosso país, nos locais de trabalho e nas escolas, cada vez mais consistem em várias culturas, grupos raciais e étnicos, bem como diversas línguas, experiências de vida e histórias.
Assim, somente por meio da articulação entre cultura, diversidade e linguagem seja possível pensar em diretrizes pedagogicamente e linguisticamente responsivas. A pedagogia culturalmente responsiva é uma abordagem centrada no aluno, em que suas características culturais únicas são identificadas e nutridas para promover o desempenho do aluno e uma sensação de bem-estar sobre seu lugar cultural no mundo. Dessa forma, é possível utilizar o conhecimento cultural, as experiências anteriores e estilos de atuação de diversos alunos para tornar o aprendizado mais apropriado e eficaz para eles, por meio do ensino centrado em seus pontos fortes. Essa abordagem de ensino ajuda todos os alunos a adquirir mais conhecimento sobre a diversidade cultural, e usar as heranças culturais, experiências e perspectivas de alunos etnicamente diversos como recursos instrucionais para melhorar suas oportunidades de aprendizagem e resultados.
A educação linguística responsiva aborda aspectos da Linguística Aplicada Crítica no que tange à validação da língua materna no processo de aprendizagem de uma língua adicional, criando possibilidades de aprendizagem de ambas, em que as crianças consigam estabelecer vínculos de uso e de valor entre as duas ou mais línguas. Assim, torna-se possível a construção de pontes entre a língua, a cultura em casa, na escola e na comunidade, dando vida à socialização da linguagem.
Para isso, é extremamente importante pensar sobre a formulação de um currículo integrado que nega a apresentação dos conteúdos escolares em campos isolados, que favorecem um distanciamento das transformações sociais, das mudanças dos saberes e nas vidas dos alunos. A pós-modernidade evoca questões sociais que apresentam algumas características, como: situações econômicas que dependem de fluxos especulativos mais do que da economia produtiva; homogeneização das opções políticas e econômicas; transnacionalização e transculturação dos valores e dos símbolos culturais, devido à mundialização dos meios de informação e comunicação; as transformações no emprego, refletidas no aumento das diferenças entre os tipos de trabalho; a progressão no volume de produção de informação; a primazia do imperativo tecnológico.
O currículo integrado possibilita a formação dos estudantes por meio da organização dos conteúdos escolares a partir de grandes temas que permitem não somente explorar os campos do saber, mas ensinar aos alunos uma série de estratégias de busca, ordenação, análise, interpretação e representação da informação, que lhes permitirá explorar uma série de outras questões de forma mais autônoma. Ao transpor a ideia de currículo integrado na esfera de ensino de línguas adicionais para crianças, focalizo a ideia social do conceito de currículo e de materialização pedagógica por meio de escolhas de gêneros considerados importantes para a formação do aluno em toda a sua riqueza e diversidade, buscando relacionar as atividades da sala de aula com as que as crianças exercem na sociedade.
Antes de tudo, é importante reconhecer a formação global da criança, de aprender pelo movimento, pela vivência de práticas que a levem a experimentar o mundo, a construir sentidos por meio das cores, cheiros, sons, imagens. Todas as formas pelas quais a linguagem também acontece e se materializa. Acredito que abordar a educação linguística na/para infância, tendo como objeto o estudo das línguas adicionais, pode ser uma grande oportunidade de estabelecer relações de igualdade social, por meio do ensinamento das diversidades, das infinitas possibilidades de comunicação e do entendimento de que tudo se relaciona e se completa. Dessa maneira, acredito que a estruturação de diretrizes nacionais sobre o ensino de línguas adicionais para crianças deve se direcionar à criação de currículos integrados, que permitem a representação da realidade de todos os agentes envolvidos no processo educativo. As relações opressoras existem e muitas vezes se reforçam. Contudo, a escola e a linguagem, uma enquanto instituição e outra enquanto fenômeno social, deveriam ser os únicos lugares em que a dominação não existisse. A língua é instrumento de libertação, de mistura de vozes e plurissignificações que a escola deve acolher, organizar e ensinar”.
(Mariana Guedes Seccato é pós – doutoranda em Estudos da Linguagem pela Universidade Estadual de Londrina, onde também obteve o título de Doutora em Estudos da Linguagem e Mestre em Estudos da Linguagem. Graduada em Letras Anglo Portuguesa também pela Universidade Estadual de Londrina. Atualmente é professora de Língua Inglesa no Colégio Celtas de Votuporanga -SP e no Colégio SESI no mesmo município. Atuou no estado de São Paulo como professora de Língua Inglesa e Língua Portuguesa. É pesquisadora do Grupo de Pesquisa FELICE (Formação de professores e ensino de línguas para crianças-CNPq) e no Grupo de Pesquisa GIEL (Grupo Interdisciplinar de Estudos da Linguagem). Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Literaturas Estrangeiras Modernas, atuando principalmente nos seguintes temas: língua inglesa para crianças, ensino-aprendizagem, lúdico, formação de professores de línguas e língua inglesa).
Por Andrea Anciaes