Em 1999 as irmãs Wachowski (Lilly e Lana) – “The Wachowskis” – lançariam o primeiro filme da então trilogia Matrix: “The Matrix” (1999), “Matrix Reloaded” (2003) e “Matrix Revolutions” (2003). Após um hiato de 18 anos, Lana Wachowski transforma a trilogia em tetralogia, lançando o “Matrix Ressurrections” (2021) que chega aos cinemas no pré-lançamento do dia 22 de dezembro deste ano.
O simbolismo presente na história – roupas e óculos negros; o próprio nome Matrix que remete a útero em latim, como algo que dá a vida; o nome do personagem protagonista “Neo”, que lembra o “novo” e também o “escolhido” (“Neo” é anagrama de “One”, que pode ser considerado “único” em inglês) – faz com que ela se perpetue no tempo e gere, para várias áreas da ciência, interpretações.
Antes de chegarmos à perspectiva jurídica, devemos notar que o cerne da película está em um grupo de pessoas que buscam desvendar o que está por detrás do percebido por nossos olhos. Como assim?
A maioria dos seres humanos foram aprisionados em cápsulas e passaram a ser controlados por máquinas, que emulam um “mundo cor-de-rosa” para que a raça humana não se revoltasse com o mundo real e assim elas pudessem se manter no poder.
Este argumento é antigo e desde o filósofo grego Platão já é conhecido, tendo sido apresentado no Livro VII de “A República” – O Mito da Caverna. Resumidamente, nós todos estamos amarrados no fundo de uma caverna olhando para uma parede que projeta nossas sombras. Como só olhamos para essas sombras desde que nascemos, não conhecemos outra coisa, até que alguém, por meio de questionamentos, consegue se desvencilhar dessas amarras e sair da caverna. No início, o sol lhe cega, mas vai acostumando aos poucos com o mundo verdadeiro.
Este que consegue escapar da caverna, segundo Platão, é o filósofo, que depois volta e ilumina os demais com o que viu lá fora. A diferença para a Matrix é que no Mito da Caverna o mundo real é muito mais iluminado e perfeito, já Morpheus, Neo e Trinity encontram um mundo obscuro e tenebroso quando tomam a pílula vermelha e dolorosa.
A história filosófica prossegue e outros buscam o que está por trás da nossa percepção de realidade. Aqui já deixo um agradecimento para meu amigo filósofo Yuri Ribeiro que me revisou as várias abordagens críticas da Filosofia.
No século XVII, René Descartes adotou uma crítica radical, duvidando da sua própria capacidade de perceber; Kant no século XVIII diz que não podemos ter consciência do objeto em si, mas só poderíamos perceber seus fenômenos. Vão pelo mesmo caminho crítico, apesar de se utilizarem de métodos e buscarem resultados diferentes, Nietzsche, Marx e Freud.
Levemos ao Direito. Por que acreditamos que um Tribunal, simbolizado pela deusa Themis, resolverá nossos problemas da vida em sociedade? É um fetiche, uma idealidade (necessária), que pode ser crucial para a paz social. Se pensarmos, conforme pesquisas do realismo jurídico, que os juízes tendem a indeferir mais pedidos antes de almoçar do que depois que voltam do almoço, por conta do nível de glicose que têm no sangue, daria para almejar uma Justiça real? Parece que não, e todo o sistema jurídico apareceria como mera ferramenta de crença, ainda necessária à nossa vã condição humana imperfeita.
Podemos parar por aqui, já que certas ilusões são necessárias para prosseguirmos. Vide na história do cinema o filme “O Nascimento de uma nação” de D.W. Griffith, de 1915, e que ampara a busca do sonho americano de sucesso até hoje.
Por fim, antes de ingressarmos pelas veredas da crítica, lembremos do alerta de Morpheus: uma vez adotada a postura crítica de perscrutação da realidade percebida – tomada da pílula vermelha do conhecimento – não há mais volta.
Bruno Arena – Advogado, Mestrando em Direito pela Universidade de Salamanca (Espanha)
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