Carros: manutenção, financiamento e troca sob as perspectivas de um mecânico 

272

Mecânico há mais de vinte anos, Márcio José Medeiros, 42 anos, e sócio-proprietário da Stilo Auto Mecânica, localizada em Votuporanga na Av. Nasser Marão, 3599, nos conta um pouco sobre sua visão e experiência no mundo automotivo.


Por Addson Luis

O carro não se resume a ser simplesmente um meio de transporte. Também abarca um símbolo social que muitas vezes define status e vai evoluindo juntamente com o homem, sempre orientado por novas tendências, tecnologias e também por determinadas políticas públicas que podem tanto modificar linhas inteiras ou condená-las ao fim.

Mecânico há mais de vinte anos, Márcio José Medeiros, 42 anos, e sócio-proprietário da Stilo Auto Mecânica, localizada em Votuporanga na Av. Nasser Marão, 3599, nos conta um pouco sobre sua visão e experiência no mundo automotivo. 

Indagado sobre os principais desafios enfrentados, Márcio responde: “Atualização, pois o setor automotivo vem desenvolvendo novos sistemas de injeção eletrônica e outras novas tecnologias como um todo. Também podemos considerar a dificuldade em aperfeiçoamento profissional, além de outro fator inerente a todo tipo de negócio: fidelização do cliente.”

Essa fala de Márcio J. Medeiros, apesar de ser referente ao setor automotivo, pode muito bem se estender a outras áreas, como o varejo, construção civil e indústria, por exemplo. E sem lançarmos mão a dados e estatísticas, por ora, pensemos o seguinte: quem nunca teve dificuldade em encontrar um pedreiro para fazer um pequeno reparo em casa? Ou qual empresário ou recrutador não sente dificuldade atualmente em encontrar mão de obra, mesmo que a vaga não necessite alta capacitação? Em uma matéria recente publicada na Veja (Negócios), há uma citação, sob dados da FGV, que 19% das empresas não conseguem encontrar pessoas para serviços elementares. E o título da matéria da revista vai mais além: “Apagão de mão de obra que afeta quase 60% das empresas brasileiras.”

Márcio J. Medeiros também conta o que faz para conseguir atender às novas demandas de mercado e o que poderia ser feito para melhorar um pouco o cenário na área.

“Me atualizo por meio de palestras disponibilizadas pela Bosch, cursos e outras fontes. Se o Senai Votuporanga tivesse mais cursos voltados à área automotiva, seria bem interessante para jovens se desenvolverem, aprenderem uma profissão e criarem uma base técnica e teórica. Como o setor atualmente carece de mão de obra qualificada, um investimento voltado a ele poderia suprir toda essa demanda.”

Durante a e entrevista, também lhe foi perguntado se o veículo elétrico é uma nova tecnologia capaz de desbancar os carros a combustão e se sua oficina vem se preparando para atender esse novo mercado.

“Não creio que irá desbancar. Há público para ambos os tipos de veículos e o carro a combustão deve continuar suas vendas por um bom tempo ainda. No caso do elétrico, ele precisa melhorar seu sistema de carregamento, tem de ser um pouco mais rápido. 

E sobre o público, vejo o elétrico mais voltado ao público mais jovem e ao uso urbano. O veículo a combustão deve continuar sendo a opção buscada pelos mais velhos, da minha idade, dos 40 anos para frente. Um ponto que mantém as vendas dos híbridos e elétricos um pouco tímidas é a manutenção, que ainda continua cara. Houve incentivos por parte do governo para fomentar a vendas desse tipo de veículo, mas não vi políticas públicas voltadas à área da manutenção. Uma oficina para fornecer um serviço a esses veículos precisa de equipamentos, EPI’s e ferramentas bem específicas, treinamento especializado e zonas controladas. Toda essa cesta de serviços demanda um alto investimento e creio que justamente por isso nossa região ainda não esteja tão bem preparada para atender as necessidades desse público.”

Também foi falado sobre a cultura bem interiorana de arrogar a superioridade dos carros mais antigos.

“Vamos pensar na durabilidade. O veículo mais novo possui um sistema de deformação que atua durante acidentes e visa absorver os impactados para garantir a integridade física de seus ocupantes. Ganha-se no quesito segurança, mas podemos dizer que há uma ‘perda de qualidade’, uma tendência à avaria. Na parte de desenvolvimento mecânico e tecnológico, por conta de toda a pressão de mercado para lançar coisas novas a todo momento, acredito que o rigor dos testes acaba não seguindo os mesmos critérios que eram seguidos antigamente. Isso acaba fazendo com que certas linhas acabem vindo com problemas crônicos de fábrica. Se a gente leva isso em consideração, acabamos realmente por dizer que o veículo antigo é melhor, é superior, e a parte positiva do veículo novo, que é seu baixo consumo, menor emissão de gases e superioridade tecnológica acaba não sendo tão levada em conta pelo consumidor.”

Ao ser questionado sobre fatores que contribuem para o cenário brasileiro atual de uma frota que vai ficando cada vez mais velha, Márcio J. Medeiros diz: “Há vários pontos para se destacar. Podemos, por exemplo, começar comparando o preço médio de uma troca de correia, que pode ficar em torno de R$300,00 atualmente para um veículo mais velho. Se a gente pegar um veículo novo, o mesmo tipo de serviço pode chegar até a R$2.500,00. Para uma troca de óleo, isso também se aplica; para um veículo antigo, o valor do litro do óleo do motor está em torno de R$28,00. Para um veículo novo, o valor pode praticamente dobrar, chegando até na faixa de R$53,00. Ainda podemos mencionar o valor do seguro e do IPVA. Então, quando alguém pensa em trocar de veículo, é preciso colocar tudo na ponta do lápis e ver se cabe no bolso. Há veículos hoje que possuem um preço de compra bem baixo, mas o custo da manutenção elevado e isso exige uma renda boa por parte do comprador.

E sobre a troca de veículo, percebi que muitas pessoas andam preferindo arrumar do que trocar. Vou dar um exemplo simples: Eu tenho hoje um carro que vale R$75 mil, ano 2018. Para eu pegar um carro mais novo, eu teria que pular para um de 2024 e desembolsar pelo menos uns R$50 mil. Ou eu posso optar simplesmente em dar as devidas manutenções nesse carro e continuar rodando com ele. E a taxa de juros também é muito alta, inviabiliza uma troca. Se você financia, acaba pagando dois carros, praticamente. E o cenário fica mais complexo ainda porque apesar da frota envelhecer e o carro ir depreciando, o custo da manutenção ainda tende a subir devido a escassez de mão de obra e ao custo dos equipamentos que segue aumentando. Antigamente, quando as taxas de juros eram menores, era bem prático trocar o carro em vez de arrumar, hoje é o inverso. O pessoal mantém, dá a manutenção em um carrinho mais velho e vai rodando com ele durante quatro ou cinco anos, até ter condições de trocar. E daí, temos o cenário atual, uma frota antiga que fica cada vez mais difícil de se renovar.”