Documento entregue à CPI da Covid mostra que o governo federal deixou de comprar mais vacinas do consórcio da OMS, mesmo sabendo que haveria reembolso em caso de desistência.
Um documento entregue à CPI da Covid mostra que o governo federal deixou de comprar mais vacinas do consórcio da OMS, o Covax, mesmo sabendo que haveria reembolso em caso de desistência.
O Brasil fechou contrato com o consórcio internacional Covax Facility em setembro do ano passado. Tinha duas opções de compra: 42 milhões de doses, que são suficientes para vacinar 10% da população, ou doses para 50% da população. O governo escolheu a opção com oferta menor.
O contrato foi tema dos depoimentos do ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo e do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, responsável pela compra. Pazuello disse que escolheu o pacote menor para não comprometer recursos federais, já que o pagamento foi feito antes da entrega das vacinas.
Mas um novo documento entregue à CPI e que a TV Globo teve acesso mostra que o argumento é falho. A informação está em uma correspondência trocada entre o Itamaraty e a embaixada do Brasil na ONU e revela que, em julho do ano passado, a Aliança Mundial para Vacinas e Imunização, a Gavi, informou ao governo brasileiro que o país seria ressarcido caso desistisse de comprar as vacinas do consórcio.
No documento, os diplomatas brasileiros disseram: “No pior cenário possível, em que não se chegue à vacina em prazo razoável, ou caso os países decidam retirar seus recursos para investir em outras soluções, a Gavi informou que seria possível, a princípio, haver a devolução do montante, após o pagamento de valores reservados”.
Mesmo assim, segundo os documentos, o Brasil optou por encomendar a quantidade mínima prevista pelo consórcio.
Os senadores da CPI consideram que agora ficou claro que o governo tomou a decisão de comprar o menor pacote do Covax Facility mesmo sabendo que receberia o dinheiro de volta se fosse necessário. E somam a isso, o fato de o governo ter demorado meses para comprar as vacinas da Pfizer e do Butantan. Especialistas apontam que a falta de vacinas é uma das causas do fracasso do país no enfrentamento à pandemia.
Outros documentos do Itamaraty enviados à CPI e obtidos pela TV Globo mostram desgaste da imagem do governo brasileiro diante de países considerados aliados do governo Bolsonaro, como Israel.
Um telegrama do diplomata brasileiro Paulo César Meira de Vasconcelos, na época embaixador do Brasil em Israel, revela que apesar do apoio público de Israel ao governo Bolsonaro, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu disse a autoridades brasileiras, em dezembro de 2019, que o presidente Jair Bolsonaro corria risco real de ser investigado por genocídio de povos indígenas e ser responsabilizado internacionalmente por omissão na proteção da Amazônia. Na época, a política ambiental brasileira era alvo de críticas em todo o planeta por causa do recorde de incêndios na Amazônia.
No documento o então embaixador brasileiro escreveu que “parece-me seguro afirmar que pelo menos parte das autoridades locais, inclusive o primeiro-ministro, acreditam que o governo brasileiro poderia vir a ser responsabilizado internacionalmente no futuro por omissão na proteção da Amazônia e até mesmo por crimes internacionais no que se refere à proteção de povos indígenas”.
No encontro com autoridade brasileira, o primeiro-ministro israelense também deixou claro que gostaria de contar com firme apoio brasileiro a seus pleitos no Tribunal Penal Internacional “uma vez que há risco real de que o presidente Bolsonaro venha a ser investigado naquele tribunal por genocídio de povos indígenas”.
*Com informações do g1/TVGLOBO