SOBRIEDADE JÁ: NÃO SOIS BANCO DE DADOS, HUMANOS É QUE SOIS…

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Uma frase do Charlie Chaplin marcou época, por expressar o perigo que ele via na frieza da relação entre as pessoas, enxergava frieza como se as pessoas fossem máquinas, aliás um elemento produtivo somente.

Não sois máquina, homens é que sois.

Penso que se Chaplin vivesse nos dias de hoje, vendo a realidade das relações atuais diria:

Não sois banco de dados, humanos é que sois.

Ou sentimentos é que sois.

De toda a criatura, o ser humano é o animal mais social que existe.

Faz parte do nosso DNA a necessidade de se relacionar, de se interessar pelo outro, pela vida do outro.

A própria ciência já confirmou isso, não precisamos ir longe. Você dentro das suas últimas 24 horas quanto tempo passou, pensando ou interagindo com outra pessoa? Você vai ver que a maior parte do seu tempo passou pensando em outras pessoas.

Nada nos interessa mais do que o outro ou a vida do outro.

Daí a razão da fofoca ser algo tão comum, e sempre foi, relatos mais antigos provam isso.

Ok! Juntando a isso sabemos que o cérebro humano tem um sistema compensatório, que é ativado por algumas circunstâncias, ou substância. Dentro desse tempo todo convivendo com pessoas que se tornaram dependentes das drogas, do álcool, da nicotina, é fácil perceber que isso se deu, pois essas substancias ativam o tal sistema compensatório do cérebro, e por isso produz prazer.

Acontece que hoje já está comprovado que as redes sociais, em geral, e aí é que eu quero chegar, também atuam nessa área compensatória do cérebro humano, um dos motivos é justamente pelo interesse na vida do outro, e essas redes nos trazem rapidamente a vida do outro.

É só surgir uma imagem nova, uma postagem nova, e isso, essas redes fazem muito bem, pois elas sabem muito mais de nós do que imaginamos, sabem nossos interesses, nossos gostos, os tais algoritmos jogam na nossa frente justamente aquilo que interessa, seja de alguém do nosso convívio, alguém que nem conhecemos, e principalmente quem não nos conhece, as tais celebridades. É automático o nosso interesse, e passamos horas abrindo abas atrás de abas, tudo em busca da tal novidade.

Vamos ser sincero, é impressionante o quanto nós nos interessamos pela vida de pessoas que não vão fazer absolutamente diferença nenhuma em nossa vida.

Vira quase uma compulsão ir abrindo páginas sucessivamente atraídos pelas manchetes chamativas, e repito, a ciência já comprovou sim que isso ativa nosso sistema compensatório da mesma forma que as drogas, como eu disse antes.

Resumindo, como todo estimulo que ativa esse sistema, as redes sociais podem sim, com toda certeza viciar.

Gente, desde de 2005 vendo de perto pessoas com vícios, identifico claramente o ciclo evolutivo do uso, primeiro é recreativo, depois abusivo, e logo o compulsivo.

Que fase dessas estaria o homem vivendo hoje em sua relação com as redes socias? Quer saber? Retira o celular de um adolescente.

Já vi demais aqui no Novo Sinai muitos que, quando estavam ativos no consumo de álcool, precisavam de uma dose de bebida para parar de tremer. Quantos que chegam até nós, e no começo do tratamento precisamos colocar leite, comida na boca, porque tremem tanto que não conseguem segurar nada, é a tal da abstinência, a dependência física chegou a um ponto que na rua uma dose de álcool faz parar de tremer.

Ok! Esses via de regra admitem o vício e procuram ajuda. Eu, você ao acordamos não precisamos de uma dose de álcool, mas infelizmente muitos precisam de seu celular a tomar “uma dose” de novidades, isso bem provavelmente antes de uma oração de agradecimento, ou do bom dia pra pessoa que até dormiu do seu lado.

Me desculpa a sinceridade, mas o que o traficante quer, é que o dependente químico consuma o maior volume de drogas possível, e nessa realidade o que o Facebook, o Instagram, o WhatsApp o Youtube quer, é que você fique o maior tempo conectado neles, tanto essas empresas como o traficante visam o lucro, seja legal ou ilegal, isso não vem ao caso agora, e quanto mais tempo você estiver conectado, mais anúncios serão vendidos.

Então a combinação do instinto nosso, o tal interesse pelo outro, com a tecnologia de aproximação, é bombástica, e deixa pessoas por horas vidrados preso as redes.

Além dessas evidências todas, é claro que tudo que nos cobra atenção nos faz gastar energia, e nós não somos uma fonte inesgotável de energia, então cada hora que passamos interessados pela vida de pessoas, por situações que não tem nada a ver com a gente, que não vai mudar em nada nossa vida, estamos desperdiçando energia que poderia ser gasta com coisas mais produtivas, acabamos jogando essa nossa energia no lixo.

Pare pra pensar: se você ficar uma hora por dia bisbilhotando a vida de quem não te faz nenhuma diferença, serão 365 horas por ano, quase 16 dias, se tirarmos 8 horas que teoricamente teriam que ser de sono, então são quase 23 dias, muito perto do número de dias, que você tem por direito a férias, depois de um ano de trabalho, repetindo só com uma hora por dia nas redes.

E um detalhe sutil, ao trazer todos esses dados para sua mente, ela acaba se transformando num HD humano, e automaticamente você instala nele o aplicativo da comparação, me informo sobre a vida de milhares de pessoas que aparentemente vivem a mil maravilhas pois só postam coisas positivas, e a comparação acaba sendo inevitável, e pode criar em você, uma decepção com a realidade.

O mundo das redes é um mundo editado e editável, a vida não.

Vivemos na sociedade mais solitária de toda história, pesquisas dizem isso, as redes só possibilitam micro relações, relacionamentos superficiais.

Uma dica, deixe de ser um banco de dados dos outros, seja um banco de sentimentos seus, seja seletivo no que te interessa.

Um ditado antigo dizia: me diga com quem você anda que te digo quem você é, hoje poderíamos atualizar: me diga por quem você se interessa que digo quem você é.

Por Carlinhos Marques
Presidente Fundador da Comunidade Terapêutica Novo Sinai, que acolhe dependentes químicos desde 2005 de forma voluntária e gratuita, idealizador do projeto “Sobriedade Já”


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