Por Carlinhos Marques –
Tenho quase que certeza que todos já fomos, como vou dizer assim, “enganados” com essa frase, seja ela no final daqueles romances bem água com açúcar, que faziam a gente ler, ou principalmente nas historiazinhas que o vovô e a vovó nos contavam para dormir. Normalmente não era assim? Terminavam com essa frase: “E foram felizes para sempre!”
Percebe que isso pode ter incutido em nosso inconsciente que tudo termina bem? Que toda história independentemente de como ela começa, ou como ela se desenvolve, ela vai terminar bem?
É aí que está o engano! Cria-se uma expectativa em nós, adultos hoje, que nossas histórias também sempre terão um final feliz. A nossa “criança interna” tenta nos convencer de que tudo, tudo vai dar certo. E acabamos criando essa expectativa. E aí vivemos hoje, de certa forma, enganado com esta história fantasiosa.
Então com o pé no chão, vamos para a realidade:
Nos deparamos facilmente hoje com uma geração mais despreparada para a frustação; despreparada para não ter o final feliz no fim de suas historiazinhas, ou no fim dos seus projetos, ou no fim de suas expectativas.
E o que eu vejo de mais latente e preocupante, é exatamente isto: a incapacidade para aceitar o contraditório, aceitar as circunstâncias contrárias às suas vontades, às suas verdades.
Veja bem: hoje em dia se fala tanto em tolerância. Tolerar o diferente, à raça diferente, à opção sexual diferente, à cor da pele diferente, ok! Justo, mas veja que estes mesmos que pregam essa tolerância acabam sendo intolerantes com eles mesmos. Intolerantes à velocidade dos seus próprios passos, e aí, nessa pressa toda por felicidade, pelas coisas prontas, acabam tropeçando em si próprios.
E olha, segundo alguns estudiosos, hoje temos a geração mais fraca desde a criação. Nós sentimos a decadência da resistência. Ouvimos muito sobre a decadência moral, a decadência dos costumes, a decadência do patriotismo, mas você já pensou na decadência da resistência?
Costumo chamar essa geração de “a geração controle remoto”, que imagina que se apertando um botão, tudo muda, tudo acontece. Tenta-se generalizar a moda do tal “fast food”, a comida rápida, estou com fome, aciono o “fast food” e rapidamente a comida chega e mata a minha fome.
Então penso que muitos dessa geração acredita que criaram, ou que podem criar o “happy fast” ou seja, a felicidade rápida!
E olha, longe de ser saudosista, mas esta expectativa da felicidade rápida, sem muito custo, soa pra essa geração como se fosse uma obrigação da vida, uma obrigação das circunstâncias, proporcionar felicidade, e felicidade rápida.
Existem até os filhos que conseguem colocar a culpa, a responsabilidade nos pais por todas as suas frustrações. E aí vão os pais lá tentar, vou repetir, tentar, porque nunca vão conseguir, serem os instrumentos plenos de satisfação dos filhos.
Eu vou dizer uma frase até meio pesada que já usei algumas vezes em palestras com os pais: “Pais! Vocês precisam sim, frustrar mais os seus filhos!” Todo mundo precisa aprender sim a se frustrar porque uma pessoa que não está acostumada à frustração, que frustração é algo novo, vai ter muita dificuldade na hora que se deparar com ela.
A maioria vive hoje aprisionada neste imediatismo absoluto e sinceramente não acredito na consistência das coisas que acontecem de imediato.
Normalmente imediatismo traz coisa passageira. Agora, aquilo que custa, que demora, normalmente é melhor e dura mais.
Estas conquistas, aliás, nem sei se posso chamar de conquistas, mas estas coisas repentinas trazem coisas e até pessoas que se tornam obsoletas no dia seguinte, olha lá se não for no minuto seguinte. Percebemos pessoas buscando soluções rápidas e fáceis para situações difíceis e acaba sendo esse imediatismo uma derrota cotidiana que vai alimentar uma frustração vitalícia.
Olha, eu vou repetir: O imediatismo cotidiano acaba alimentando a infelicidade, a frustração para sempre. Esta sensação do foram “felizes para sempre” está contribuindo sim para um mundo hoje, onde nunca se consumiu tanta medicação, por exemplo, para ansiedade.
É uma geração, um momento da história onde se toma energético para ficar acordado de dia e remédio para dormir a noite. Olha a contradição!
Nunca se escreveu tantos livros de autoajuda. Nunca psicólogos, coach, estiveram tão em alta como hoje. Gente com orgulho de bater no peito e dizer: “Eu quero para ontem!”, o “espera um pouco” não interessa.
Se sofre de pressa na alma, se sofre da necessidade imediata de felicidade. E isso acaba por se fazer perder oportunidades, porque o imediatismo é um dos maiores ladrões de sonhos, e de sonhos realizáveis.
Temos almas apressadas demais e aí fica inevitável eu citar uma passagem bíblica, do Livro do Eclesiastes, que diz: “Há um tempo para cada coisa. Há um tempo para todo o propósito debaixo do Céu e da terra; há tempo para nascer, há tempo para morrer, tempo para plantar, tempo para colher, tempo para ganhar, tempo para perder, tempo de ficar calado, tempo de falar.”
Aí se você procurar nesse mesmo livro de Eclesiastes 3, você vai ver escrito ali: “Há um tempo para ser feliz, e ainda completa que: Há um tempo para sorrir, um tempo para chorar.”
Precisa ficar claro que nem lágrimas e nem sorrisos são para sempre; tudo passa! Vamos parar de prestigiar tanto o supérfluo.
Parar de acreditar que a felicidade está na próxima invenção, que teremos saúde plena quando um possível novo medicamento for inventado.
Nós somos humanos e estamos sujeitos aos ciclos.
E como ensinou minha mamãe:
“Felicidade nunca será uma estação de chegada, mas sim uma forma de viajar!”
Por Carlinhos Marques
Presidente Fundador da Comunidade Terapêutica Novo Sinai,
que acolhe dependentes químicos desde 2005 de forma voluntária e gratuita, idealizador do projeto “Sobriedade Já”
Informações:
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