Policiais são investigados por suposto favorecimento a suspeitos de matar rio-pretenses no PR 

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Carro foi retirado do bunker na madrugada de sábado (13) — Foto: PM-PR Ambiental/Reprodução

Os agentes afastados são suspeitos de passar informações a Antonio Buscariollo e Paulo Ricardo Buscariollo, que estão foragidos; vítimas foram executadas com tiros de fuzil.


A Polícia Civil do Estado do Paraná cumpriu nesta terça-feira (9.dez), mandados de busca e apreensão contra dois policiais civis de Icaraíma/PR suspeitos de colaborarem com informações que possam ter favorecido os suspeitos de participação no homicídio das quatro vítimas (três delas de São José do Rio Preto/SP e um de Olímpia/SP) que cobravam uma dívida referente a compra de uma propriedade rural. O crime aconteceu em agosto deste ano.

A investigação sobre as mortes de Robishley Hirnani de Oliveira, Rafael Juliano Marascalchi, Diego Henrique Afonso e Alencar Gonçalves de Souza completou quatro meses no dia 5 dezembro. 

Segundo informações do delegado Gabriel Menezes, após investigações desenvolvidas pelo delegado titular de Icaraíma, Thiago Andrade Inácio, e pela 7° SDP de Umuarama, constatou-se possível comunicação entre tais agentes públicos e os investigados depois do crime: “Diante disso, as informações foram repassadas à Corregedoria da Polícia Civil, que requereu mandados de busca e apreensão, visando a obtenção de novas informações para apurar os fatos. Destaca-se que, em nenhum momento, foram levantadas informações sobre envolvimento de agentes públicos com a morte das vítimas”, informou a Polícia Civil.

O que se busca apurar, segundo Menezes, é, se após o crime, os investigados tiveram algum benefício com informações que possam ter facilitado a fuga ou destruição de vestígios para prejudicar as investigações: “Tudo está sendo devidamente apurado pela Corregedoria da Polícia Civil. Por fim, como nova providência para garantira completa lisura e imparcialidade dos trabalhos investigativos, os agentes públicos serão removidos da unidade policial e alocados em outras unidades, tendo em vista que, outrora, medidas de maior sigilosidade e compartimentação das informações já foram adotadas”, finaliza a nota oficial.

Os principais suspeitos do crime são Antonio Buscariollo, de 66 anos, e o filho, Paulo Ricardo Costa Buscariollo, de 22. A Polícia Civil (PC-PR) considera os dois como foragidos desde o dia 9 de agosto.

Linha do tempo do assassinato

Robishley Hirnani de Oliveira, Rafael Juliano Marascalchi, Diego Henrique Afonso saíram de São José do Rio Preto. Eles foram contratados por Alencar Gonçalves de Souza para cobrar uma dívida em Icaraíma, no noroeste do Paraná. A investigação apurou que as vítimas foram mortas instantaneamente em uma emboscada após a cobrança. 

Segundo a polícia, Alencar contratou o serviço de cobrança com Diego, pelo custo de 50% do valor da dívida. 

Os cobradores chegaram a Icaraíma na tarde do dia 4 de agosto e foram com Alencar até o distrito de Vila Rica para fazer o primeiro contato com Antônio e Paulo. Nesta ocasião, a polícia apurou que os Buscariollo tentaram ceder uma casa na área urbana da cidade, mas as partes não chegaram a um acordo. 

No dia seguinte, por volta das 10h26, os quatro homens foram novamente até Vila Rica para cobrar a dívida, mas não encontraram os Buscariollo e retornam a Icaraíma. 

Por volta das 12h04 do dia 5 de agosto, os quatro homens foram mais uma vez a Vila Rica, com uma Fiat Toro. A investigação da polícia apurou que as vítimas foram mortas assim que chegaram à propriedade rural que era objeto da dívida, por volta das 12h30. 

“Possivelmente, foram alvos de uma emboscada, com o início dos disparos quando eles ainda estavam dentro do veículo Fiat Toro, chegando no local. Foram realizados disparos de, ao menos, cinco armas de fogo, de calibres diversos, deflagrados de três pontos distintos, atingindo o veículo na parte da frente, parte traseira e pelo lado esquerdo”, afirma a polícia. 

A investigação reuniu um conjunto de indícios que indicam que os quatro homens não foram sequestrados, nem mantidos em cativeiro ou torturados, pois as mortes foram instantâneas. 

Após serem assassinados, de acordo com a polícia, os quatro corpos foram levados, dentro do próprio carro, até a cova onde foram enterrados. Em seguida, o veículo foi levado até um bunker e enterrado. 

“Essa conclusão é possível porque os disparos foram realizados, possivelmente, quando as vítimas ainda estavam na Fiat Toro, atingindo regiões vitais (cabeça e tórax), o que torna remota a possibilidade de sobrevida para manutenção em cativeiro. […] Ainda, a localização de pedaços do veículo Fiat Toro na cova onde as vítimas estavam aponta que os corpos foram retirados às pressas da Fiat Toro e colocados na cova, logo após a execução. Há imagens de câmeras de segurança que foram obtidas pela Polícia Civil que mostram o veículo Fiat Toro seguindo em direção ao local da cova logo após a execução, robustecendo a tese de que houve morte instantânea, seguida do enterro dos corpos e do veículo”, diz a polícia.

As imagens de câmera de segurança não foram divulgadas pela polícia. Segundo o delegado Gabriel Menezes, as informações relacionadas à autoria do crime ainda seguem em investigação. 

Os laudos de necropsia dos corpos dos quatro homens revelaram que eles foram encontrados em estado de saponificação — uma reação química que interrompe a decomposição natural, preservando os corpos das vítimas. Segundo o relatório da polícia, isso foi possível em razão das características do solo em que eles foram enterrados. Veja detalhes dos laudos abaixo: 

  • Robishley Hirnani de Oliveira: Foi morto com três tiros nas costas, um na cabeça, um no braço e dois no tórax. Um projétil ainda estava alojada na cabeça;
  • Diego Henrique Affonso: Morto com nove disparos, sendo um na cabeça, seis no tórax, dois nos braços. Dois projéteis e um fragmento foram encontrados no corpo dele;
  • Rafael Juliano Marascalchi: Morto com seis tiros, sendo três na cabeça, dois no tórax e um na perna;
  • Alencar Gonçalves de Souza Giron: Um tiro na cabeça. 

O laudo ainda concluiu que os tiros foram disparados de pelo menos três pontos diferentes e que foram usadas ao menos cinco armas, sendo uma delas um fuzil. Por isso, a polícia afirma que trabalha com a linha de investigação de que pelo menos cinco pessoas participaram do crime.

Polícia descobriu que local onde crime aconteceu é próximo de onde carro e corpos foram enterrados — Foto: Polícia Civil (PC-PR)

Áudios mostram que vítimas desconfiavam que devedores eram envolvidos com crime organizado 

Nesta quarta-feira (10), a Polícia Civil (PC-PR) também divulgou áudios que mostram que as vítimas desconfiavam que os devedores eram envolvidos com tráfico de drogas e contrabando de cigarros. 

Em um dos áudios enviados por Alencar a Diego Henrique no início da negociação da cobrança de dívida, ele diz que está com medo de uma possível retaliação por parte dos Buscariollo, pois acreditava que eles estavam envolvidos com o crime organizado. O áudio foi enviado no dia 4 de agosto. 

“É esse ponto aí que eu estava meio receoso de te falar, Henrique. Ele mexe com uns trem errado aqui. Tivemos a notícia dele depois que eu fui entrar em contato aqui, mexer com a compra do sítio, aí que eu fui saber quem era o cara”, disse Alencar no áudio. 

No dia 5 de agosto, após o primeiro encontro entre os quatro homens e a família Buscariollo, Diego mandou um áudio para a esposa dizendo que a situação estava complicada. Na conversa, ele menciona o envolvimento dos Buscariollo com o contrabando. 

“Hoje tá um pega aqui do c*****. Correria! O povo se escondeu. O bicho tá pegando aqui hoje, hein? Vai fazer esse trem dar certo aqui, mas nós estamos num pega meio brabo aqui. O cara trafica cigarro aqui, passa pro Paraguai, sem vergonha, malandro. Nós estamos meio esperto por causa de tiro, assim, dessas coisas, né? Mas vai dar certo, sim. Se Deus quiser, alguma coisa vai dar certo”, disse Diego para a esposa. 

De acordo com o delegado Gabriel Menezes, há indícios de que a família Buscariollo tem ligação com o contrabando de cigarros e com o tráfico de drogas, e que esse esquema pode envolvê-los com o crime organizado. Esses indícios ainda estão sendo investigados. 

Quem são as vítimas 

Em novembro, polícia divulgou as fichas criminais dos quatro homens e afirmou que existe uma investigação para apurar se eles possuíam envolvimento com o crime organizado. O resultado dessa investigação não foi divulgado. 

Além disso, durante as buscas, familiares e amigos falaram sobre os quatro homens e deram mais detalhes sobre a vida deles. 

Diego Henrique Affonso 

Morador de Olímpia, acompanhava Rafael e Robishley na viagem para Icaraíma com a missão de cobrar a dívida. Ficha criminal: 

  • 2024: ameaça contra esposa, no âmbito de violência doméstica (Lei Maria da Penha), estelionato;
  • 2023: estelionato, ameaça, redução a condição análoga à de escravo;
  • 2022: ameaça, estelionato;
  • 2021: estelionato, difamação, ameaça, injúria;
  • 2019: apropriação indébita;
  • 2018: ameaça.

Segundo a Polícia Civil, Diego não chegou a ser preso nos casos. Houve apenas os registros dos crimes imputados a ele. 

Rafael Juliano Marascalchi 

Morava em São José do Rio Preto, era casado, pai e avô. Vivia da renda de seus imóveis e, segundo a família, ocasionalmente fazia serviços de cobrança para conhecidos. Ficha criminal: 

  • 2025: ameaça;
  • 2023: exercício arbitrário das próprias razões – fazer justiça com as próprias mãos;
  • 2022: exercício arbitrário das próprias razões – fazer justiça com as próprias mãos;
  • 2018: ameaça;
  • 2017: ameaça contra a esposa, no âmbito da violência doméstica e familiar.
  • 2014: ameaça;
  • 2008: tráfico de drogas e associação para o tráfico de drogas;
  • 2007: tráfico de drogas;
  • 2005: tentativa de homicídio.

Segundo a Polícia Civil, ele foi preso em 2005, 2007, 2008 e 2010. 

Robishley Hirnani de Oliveira

Tinha dois filhos, uma menina de sete anos e um bebê de oito meses. Era amigo de Rafael e o convidou para a viagem, tendo já trabalhado com ele em outras ocasiões. Ficha criminal: 

  • 2018: dano, estelionato, ameaça;
  • 2017: estelionato;
  • 2016: ameaça, exercício arbitrário das próprias razões, ameaça contra esposa no âmbito da violência doméstica, lesão culposa no trânsito e fuga do local do acidente, estelionato;
  • 2015: estelionato;
  • 2014: embriaguez ao volante, estelionato, ameaça;
  • 2013: ameaça contra esposa no âmbito da violência doméstica; crime ambiental contra flora;
  • 2003: furto qualificado;

Segundo a Polícia Civil, ele foi preso em 2022. 

Alencar Gonçalves de Souza 

Morador de Icaraíma, foi quem contratou os serviços do trio de São Paulo. Era próximo da família de uma das outras vítimas. Ele não possuía antecedentes criminais. 

Motivação do crime: dívida e emboscada 

Segundo a polícia, a motivação era a cobrança de uma dívida de R$ 255 mil, relacionada à venda de uma propriedade rural por Alencar à família Buscariollo. 

O pagamento foi dividido em dez notas promissórias de R$ 25 mil cada, mas nenhuma parcela foi paga. 

Em setembro, o delegado Gabriel Menezes disse que, apesar dessa falta de pagamento, a propriedade foi transferida para um dos filhos de Antonio e foi registrada em cartório no dia 5 de agosto de 2024. 

A suspeita é de que Antonio e Paulo Buscariollo tenham participado de uma emboscada no momento em que os quatro homens foram cobrar esse valor. 

Identificação de suspeitos e mandados de prisão 

Pai e filho são considerados foragidos pelo desaparecimento de quatro homens — Foto: PCPR

No dia 6 de agosto, Antonio e Paulo Buscariollo receberam os policiais na propriedade deles, no distrito de Vila Rica do Ivaí. Os dois aceitaram ir à delegacia, onde confirmaram que houve um negócio de compra e venda de uma propriedade rural entre Alencar e dois parentes, mas negaram relação direta com a dívida. 

Após serem liberados, eles desapareceram, assim como todos os familiares deles que moravam no mesmo local. 

No dia 9 de agosto, a Justiça expediu mandados de prisão temporária contra os dois. Eles permanecem foragidos desde então. 

Antonio possui antecedente criminal por posse ilegal de arma de fogo, mas Paulo não tem passagens pela polícia. 

Os nomes dos familiares deles, que também sumiram, não foram divulgados. Porém, a polícia disse que todos são investigados.

*Com informações do g1