Os (des)rumos do Judiciário

1430

 

NILSON CALIGIURI FILHO –

Inicialmente, a quem ainda não me conhece, sou Nilson Caligiuri Filho. Sou há um tempo razoável, advogado militante na Comarca de Votuporanga e demais da região. Resido na vizinha Valentim Gentil.

Sou especialista em Ciências Penais e em Direito do Consumidor. Também sou escritor, tendo, o último livro publicado, o título “Vida e morte e demais reflexões contemporâneas”.

Feita essa breve apresentação sobre o Autor e o profissional que vos escreve, passar-se-á ao tema, propriamente dito, não sem antes uma breve introdução.

É de conhecimento de todos que a República Federativa do Brasil é constituída por três poderes, separados e independentes, porém, harmônicos entre si (sistema da repartição/separação tripartite): Legislativo, Executivo e Judiciário. Esse sistema, adotado pelo Brasil, fora inspirado em Montesquieu, com algumas diferenças, haja vista que, na original teoria do citado filósofo, ter-se-ia, por poderes: o poder legislativo, poder executivo das coisas que dependem do direito das gentes e o poder executivo daqueles que dependem do direito civil. Judiciário não seria poder, na teoria de Montesquieu, mas mera função do Estado.

Pois bem. Como dito acima, tais poderes devem conviver harmonicamente (“harmonicamente” não significa “impunemente”, como, equivocadamente, entendem e pregam alguns “líderes” dessa nação). O Legislativo exerce típica função legislativa e, atipicamente, as funções executivas e judiciais (como por exemplo, processos de Impeachment). O Executivo exerce típica função executiva e, atipicamente, as funções legislativas (como, por exemplo, pela expedição de decretos) e judiciais. O Judiciário exerce típica função judicial e, atipicamente, as funções legislativas e executivas. Não se descure que esses três poderes coexistem em todas as esferas da

República.

Poder-se ia discorrer imensamente sobre os três poderes. Entretanto, o escopo desse artigo é discutir acerca do Judiciário. O Poder Judiciário, o tão combatido Poder Judiciário, sempre fora, talvez, o mais respeitado, e no qual o brasileiro sempre depositara maior confiança e  credibilidade, e isso, em grande parte, face às sucessivas corrupções que sempre, infelizmente, assolaram os outros dois poderes (claro que, para toda regra, existe uma exceção!).

Igualmente, sempre tive e tenho o maior respeito pelo Judiciário e por todos os seus atores (que, com amor, desempenham tão árdua missão), o Poder Judiciário, em suma, possui tão importante missão, em suma e sem prejuízo de outras, de aplicar a lei e, consequentemente, zelar pela paz social.

Observe-se, aqui, que há um erro cometido por muitos, em especial por advogados, no final dos pedidos de suas petições, os quais fazem um brado por justiça, muitas vezes até abusando das exclamações (!!!!), ou com exageros retóricos (por exemplo, as frases “como mais lidima justiça” ou “como mais sublime justiça”). É preciso sanar esse erro: o que se espera do Poder Judiciário não é, diretamente, a justiça, mas, sim, a aplicação da lei! Lembrando que, em muitos casos, a lei não é justa.

E, ademais disso, o conceito de “Justiça” é muito subjetivo, sendo um dos raros temas, tal como a “verdade”, em que mais vale o resignado saber de que nunca encontraremos um significado ou resposta inconteste para tal.

Em sua função primordial, que é aplicar a lei, o Judiciário, caminha, em que pese a boa vontade de todos, rumo ao abismo, seja por excessivos ativismos judiciais, seja (aqui é o que mais tenho visto na prática), por aplicações

ERRADAS, DISTORCIDAS DA LEI (ISSO QUANDO A LEI NÃO É EVIDENTEMENTE IGNORADA, O QUE É AINDA MAIS GRAVE)!

Na minha atividade advocatícia, tenho me deparado com sucessivos “atropelamentos” em cima da legislação, seja ela federal ou estadual, ou até mesmo municipal ou consuetudinária (costumeira). Temos visto alguns órgãos ou atores da justiça: simplesmente “baixando normas internas” contrariando frontal e violentamente texto de Lei Federal; decisões contrárias às provas dos autos e, principalmente, o que mais tem acontecido e mais me preocupa: incorreções, ilegalidades e abusos para se conceder o benefício da Gratuidade da Justiça, que é um benefício previsto em lei para aquelas pessoas que não podem pagar custas processuais ou honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.

Nesse último tópico (Justiça Gratuita), tem, em muitos casos (sem generalizar), havido aplicação AO CONTRÁRIO do que manda a lei, mais especificamente o artigo 99, parágrafos segundo e terceiro do Código de Processo Civil. Em suma, a lei processual diz que o benefício da justiça gratuita SÓ deve ser negado se HOUVER nos autos indícios de riqueza. Infelizmente, o que a maioria dos julgadores têm feito: exigido provas máximas de pobreza, para conceder o benefício que, frise-se, é presumível quando se tratar de pessoa natural. No fim, o verdadeiramente pobre é o que mais sofre para acessar a justiça!

Portanto: uma chuva de ilegalidades e abusos com exigências tais, aplicando-se, pois, o CPC ao contrário. E essa situação tem DIFICULTADO, COMO DITO AIMA, EM DEMASIA, O ACESSO À JUSTIÇA POR AQUELE QUE MAIS DELA PRECISA: O POBRE!

Não bastasse a aplicação ao reverso da legislação, muitas vezes são feitas exigências absurdas, não previstas em lei, como: fotos da casa, pedidos de certidões do Detran, do Registro de imóveis, e por ai vai. Afora isso, a excessiva morosidade do Poder Judiciário, ainda preocupa.

Nem mesmo a criação dos Juizados Especial, pela Lei 9.009/95, resolveu a celeuma. No que tange à morosidade, me refiro ao sistema como um todo, pois, nesse quesito, nossa Comarca é exemplo e tem apresentado uma celeridade invejável, com prolação de sentenças em curto espaço de tempo. A insegurança jurídica, em todas as instâncias, também é algo arrebatador.

Nem o passado parece ser certo! Portanto, Senhores, muita coisa precisa ser revista no Judiciário, para que este retome seu respeitado rumo. Não se está aqui, criticando a instituição (a qual temos profundo respeito e admiração), mas, tão somente, convocando todos os atores da justiça (inclusive eu próprio) para que haja melhorias, mais respeito à lei e mais satisfação concreta ao jurisdicionado. Tampouco se está criticando ator algum da Justiça, mas tão somente o sistema em si, que caminha para o caos, se o todo não for urgentemente repensado e mudado.

É preciso menos formalidades arcaicas e mais satisfação plena e ágil dos pleitos. Só assim uma sociedade conviverá em paz e harmonia! Para isso, é preciso mexer nas profundezas: é preciso urgentemente, rever todo o sistema. Urge investir em melhoria pessoal, em todo o sistema informatizado ou não e, principalmente, REVER a forma com que são elaborados concursos públicos  nesse país, haja vista que, em que pese a boa-vontade de todos, há muitos bons advogados, juízes e promotores que não o são (não passam em provas mirabolantes) e muitos ruins (tecnicamente) que infelizmente o são. É necessário, pois rever todo o sistema, ponto por ponto.

E as instituições, como a OAB, CNJ e outros, precisam se unir e conclamarem por mudanças! Do fundo do meu coração, embora cético, espero, sinceramente, que um melhor porvir venha, acabando com esse desrrumo tomado, para que o nosso Judiciário, nosso tão combatido e jamais vencido Judiciário continue, ad eternum, a ser o meu, o seu, e, principalmente, do pobre, o mais seguro porto a depositar suas esperanças!

Abraços a todos.

NILSON CALIGIURI FILHO

OAB/SP 309.880