Neste 31 de março de 2024, completam-se 60 anos do início de um dos períodos mais sombrios do Brasil

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De caráter autoritário e nacionalista, a ditadura teve início com o golpe militar que derrubou o governo de João Goulart, o então presidente democraticamente eleito. (Foto: Divulgação/EBC)

A destituição do presidente João Goulart, legitimamente eleito, pelo golpe militar de 31 de março de 1964, completa 60 anos neste domingo (31). O início foi a vinda de tropas comandadas pelo general Olímpio Mourão Filho, de Juiz de Fora (MG) em direção ao Rio de Janeiro, que foi ganhando adesão de demais comandantes militares. Após o golpe, Mourão caiu no ostracismo e não foi elevado à cúpula dos militares que comandaram o País.

As primeiras movimentações militares começam na madrugada do dia 31 de março para o dia 1° de abril de 1964. Efetivamente o golpe aconteceu no dia 1º de abril, consagrado como o Dia da Mentira, mas para evitar se associar com essa data, os golpistas, anteciparam o que iria ocorrer no dia seguinte, para 31 de março.

Até o dia 2 de abril o país passa por um processo de derrubada do presidente, que termina quando o Congresso declarando vaga a presidência e empossa Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados, que se prestou a ser figurante no processo golpista.

A professora da Universidade Federal Fluminense (UFF) Joana Darc Fernandes Ferraz sintetiza o que foi a ditadura militar no Brasil. “A ditadura militar no Brasil foi um período marcado pela imposição de um modelo econômico favorável aos interesses empresariais e militares, que resultou em violações generalizadas dos direitos humanos e marginalização de grupos vulneráveis. Até por isso, nós, historiadores e pesquisadores, preferimos chamar esse período de Ditadura Empresarial-Militar Brasileira.”

Os impactos da ditadura militar foram profundos e generalizados na vida das pessoas comuns no Brasil. Foi um período marcado por uma repressão intensa e pelo cerceamento das liberdades individuais. Muitos brasileiros enfrentaram prisões arbitrárias, tortura e até mesmo desaparecimentos forçados por expressarem suas opiniões políticas contrárias ao regime.

Período

Apesar das promessas iniciais de uma intervenção breve, a ditadura militar durou 21 anos. Além disso, a ditadura foi se intensificando por meio da publicação de diversos Atos Institucionais, culminando com o Ato Institucional Número Cinco (AI-5) de 1968, que vigorou por dez anos.

A Constituição de 1946 foi substituída pela Constituição de 1967 e, ao mesmo tempo, o Congresso Nacional foi dissolvido, liberdades civis foram suprimidas e foi criado um código de processo penal militar que permitia que o Exército brasileiro e a Polícia Militar pudessem prender e encarcerar pessoas consideradas suspeitas, além de impossibilitar qualquer revisão judicial.

O regime adotou uma diretriz nacionalista, desenvolvimentista e anticomunista. A ditadura atingiu o auge de sua popularidade na década de 1970, com o “milagre econômico”, no mesmo momento em que o regime censurava todos os meios de comunicação do país e torturava e exilava dissidentes.

Na década de 1980, assim como outros regimes militares latino-americanos, a ditadura brasileira entrou em decadência quando o governo não conseguiu mais estimular a economia, controlar a hiperinflação crônica e os níveis crescentes de concentração de renda e pobreza provenientes de seu projeto econômico, o que deu impulso ao movimento pró-democracia.

O governo aprovou uma Lei de Anistia para os crimes políticos cometidos pelo e contra o regime, as restrições às liberdades civis foram relaxadas e, então, eleições presidenciais indiretas foram realizadas em 1984, com candidatos civis e militares. O regime militar brasileiro inspirou o modelo de outras ditaduras por toda a América Latina, através da sistematização da “Doutrina de Segurança Nacional”, a qual justificava ações militares como forma de proteger o “interesse da segurança nacional” em tempos de crise.

Desde a aprovação da Constituição de 1988, o Brasil voltou à normalidade institucional. Segundo a Carta, as Forças Armadas voltam ao seu papel institucional: a defesa do Estado, a garantia dos poderes constitucionais e (por iniciativa desses poderes) da lei e da ordem.

Apesar do combate aos opositores do regime ter sido marcado por torturas e assassinatos, as Forças Armadas sempre mantiveram um discurso negacionista. Só admitiram oficialmente a possibilidade de tortura e assassinatos em setembro de 2014, em resposta à Comissão Nacional da Verdade. No entanto, apesar das várias provas, os ofícios internos da Marinha do Brasil, do Exército Brasileiro e da Força Aérea Brasileira, foram uníssonos em afirmar que em suas investigações não encontraram evidências que “corroborassem ou negassem” a tese de que houve “desvio formal de finalidade no uso de instalações militares”.

Em maio de 2018, o Departamento de Estado dos Estados Unidos divulgou um memorando de 11 de abril de 1974 que afirma que a cúpula da ditadura não apenas sabia, como também autorizava as torturas e assassinatos que foram cometidos contra opositores.

Estima-se que houve 434 mortos e desaparecidos políticos durante o regime, além de um genocídio de povos nativos que matou mais de 8,3 mil indígenas brasileiros por negligência e por ações específicas visando ao massacre indígena. (O SUL)