MERALDO ZISMAN
Nicolau Maquiavel (1469-1527) foi um filósofo, político, historiador, diplomata e escritor italiano, autor da obra-prima “O Príncipe”. Foi profundo conhecedor da política da época, refletiu-a em suas várias obras. Realista e patriota, definiu os rumos para a união da Itália.
As Ciências Sociais são um ramo das ciências distinto do das Humanidades, que estuda os aspectos sociais, ou seja, o relacionamento entre indivíduos ou grupos humanos. Isso inclui antropologia, sociologia, ciência política, estudos da comunicação, “marketing”, administração, arqueologia, geografia humana, história, ciência da religião, contabilidade, economia, direito, psicologia social, filosofia social, e serviço social.
O mais famoso dentre os autores/filósofos elencados para o estudo dessas matérias é o diplomata Nicolau Maquiavel. Além de filósofo foi também historiador, poeta e músico, tendo vivido em tempos de grandes mudanças culturais no Ocidente.
É reconhecido como fundador do pensamento e da ciência política moderna, pelo fato de ter escrito sobre o Estado e o governo como realmente são. Não como deveriam ser.
A sua principal obra, O Príncipe, escrita em 1513 e publicada postumamente em 1532 é utilizada em cursos de administração de empresas no século XXI, além de fazer parte da bibliografia mandatória para o ensino das ciências políticas.
Não poucas vezes realizam-se estudos deturpados desse clássico e interpreta-se erroneamente o significado do adjetivo maquiavélico como pertencente a uma corrente de pensamento negativo, quando na verdade foi Maquiavel um pensador revolucionário do ponto de vista ético, pois reflete sobre as más ações, a fim de justificá-las.
Esta é uma das razões pelas quais seu pensamento causa tantas consequências e é motivo de debate e objeto de controvérsias até hoje, em pleno século XXI.
Por outro lado, existem diversas áreas na sua filosofia e uma delas é definida pela importância que Nicolau Maquiavel dá à luta pelo Poder a qualquer preço, assim como as agências, companhias, empreendimentos atuais visam ao lucro a qualquer preço, esquecendo-se por vezes da Ética e ficando bem longe de qualquer laivo moral.
Concentrarei meu vozerio neste escrito, sublinhando algumas passagens de O Príncipe.
No capítulo 16, o príncipe (governantes) é orientado sobre como cuidar de suas finanças para não ser visto como gastador e ser culpado por levar o povo à pobreza, cobrando muitos impostos para manter-se rico. O autor diz que o melhor é ser visto (o governante) como miserável, pois com este julgamento ele poderá ser generoso quando bem entender e o povo irá se acostumar com isso.
Parece-me que esse raciocínio tem alguma coisa a ver com a Corrupção Brasileira.
Do capítulo 20 ao 22 ensina Maquiavel n’O Príncipe:
(20). Como um príncipe deve agir para ser estimado;
(21). Dos secretários que devem acompanhar o príncipe;
(22) Como evitar os aduladores.
O que Maquiavel, na sua linguagem renascentista, chamava de líder pode ser hoje substituído por Chefe de Estado ou de Governo, denominação assegurada pela Constituição Brasileira de 1988 ao Presidente Eleito.
O chefe do executivo necessita saber controlar os arroubos das elites e dos seus auxiliares, além de manter seu povo feliz, protegendo-o dos bajuladores e controlando seus secretários (ministros e os demais ocupantes dos escalões governamentais) que constituem a moderna Administração Federal. Lembrar sempre que o Renascimento trouxe uma série de avanços culturais assemelhadas ao que estamos vivendo no momento com os algoritmos e a ‘internet’, sem falar na robótica ou na inteligência artificial.
O nosso Maquiavel procura fundamentar uma filosofia política que visa a dominação dos homens. Essa pretensão tinha como modelo as Ciências Naturais que estavam recém descobertas (física, medicina, etc.), estabelecidas por Galileu e através do próprio ideal renascentista de domínio da natureza. Deduzia o filósofo que se existe uma uniformidade nas leis gerais das ciências naturais, também deveria havê-la nas ciências humanas e a ciência política deveria levar a que se saiba como fazer para se manter no Poder.
A concepção de história do filósofo era cíclica e os governos sempre se degeneravam: da monarquia ou república à tirania, desta à oligarquia e à aristocracia, que, no que lhe concerne, recaíam na democracia que, enfim, só terá solução com um ditador.
Isso acontece (e se repete) porque os seres humanos têm uma essência universal: é o desejo de Poder e o egoísmo dos homens (governantes e seus sucessores) que fazem com que o governo se degenere.
Termino citando o mal compreendido e grande filósofo renascentista.
Excertos da vasta bibliografia sobre Nicolau Maquiavel:
- Quando os ricos percebem que não podem resistir à pressão da massa, unem-se, prestigiando um dos seus e fazendo-o príncipe, de modo a poder perseguir seus propósitos à sombra da autoridade soberana. O povo, por outro lado, quando não pode resistir aos ricos, procura exaltar e criar um príncipe dentre os seus que o proteja com sua autoridade. Quem chega ao poder com a ajuda dos ricos tem maior dificuldade em manter-se no governo do que aquele apoiado pelo povo, pois pode dirigi-lo ou ordenar tudo o que se lhe apraz.
- Todo homem é de alguma forma político, mesmo que muitos cabeçudos alienados não tenham consciência disso e até afirmem que são apolíticos. Crassa tolice, pois, se não são agentes em menor ou maior escala da política, são os instrumentos, objetos ou marionetes dos agentes políticos que os manipulam.
- A política tem pelo menos duas caras: a que se expõe aos olhos do público e a que transita nos bastidores do poder.
Passeando pelo livro de Carlos Lacerda (1914-1977) intitulado Cão Negro; impressões de Maquiavel, profere o político brasileiro: “Há quatrocentos anos ele é vítima de mal-entendidos. Confundiram suas descrições com as suas intenções. Tomaram-nas com receita ideal para formar um Estado moderno, baseado na soberania do povo. Maquiavel estava muito à frente de seu tempo”.
- Meraldo Zisman – Médico, psicoterapeuta. É um dos primeiros neonatologistas brasileiros. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Vive no Recife (PE). Imortal, pela Academia Recifense de Letras, da Cadeira de número 20, cujo patrono é o escritor Álvaro Ferraz.