Em princípio, a investigação aberta pela Polícia Federal não tem como foco a imprensa.
A investigação aberta pela Polícia Federal para apurar o vazamento de áudios de assessores do ministro Alexandre de Moraes não deveria incluir a Folha de S. Paulo e os repórteres responsáveis pela matéria. Essa é a visão de cinco especialistas ouvidos pela CNN.
“A posição do Supremo em relação à atividade jornalística é de proteção ampla e que se sobrepõe a outros direitos individuais, sempre, quando em colidência”, lembra o advogado Alexandre Fidalgo, especialista em liberdade de expressão.
Ele explica que há dois princípios que protegem o direito do jornalista a manter sua fonte sob sigilo: o interesse público e a Constituição Federal.
A opinião é a mesma do constitucionalista Pedro Serrano: “A meu ver a Folha e os jornalistas não cometeram ilícito algum, aliás estavam no exercício de seu direito de informar, garantido pela Constituição. Se houve vazamento de algum dado sigiloso por servidor público ele responderá pelo crime, pois ele é que tem o dever de guarda da informação. Nossa Constituição protege o direito de fonte, a Folha e os jornalistas não estão obrigados a informar quem são”, diz.
De fato, a Constituição de 1988 prega que a fonte deve ser resguardada quando necessário. O inciso XIV do artigo 5º diz que “é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”.
O advogado Bruno Sales entende se tratar de uma ‘questão simples’. Ele lembra, no entanto, que “quem obteve ilegalmente as mensagens e passou para o jornal pode e deve ser investigado”.
A Folha de S. Paulo afirma que obteve as mensagens de forma legal.
Bruno ainda faz um paralelo com a Vaza Jato, uma vez que “Glenn Greenwald e o site The Intercept não foram acusados”. Já “o hacker responsável por obter as mensagens foi descoberto e punido em uma operação à parte”.
Marco Aurélio Carvalho afirma que os jornalistas e o jornal não têm obrigação de entregar as fontes: “O sigilo de fonte resguarda essa atividade profissional e nós sabemos que é um dos pilares que fortalece em toda e qualquer democracia, então me parece evidente que em relação a isso tanto o jornal como os jornalistas podem ficar tranquilos”, sustenta ele.
“O que ele pode, na verdade, eventualmente fazer é ao investigar os assessores, aí sim descobrir as circunstâncias em que esses áudios foram vazados, mas não pode nem investigar os jornalistas, nem o jornal, nem tampouco responsabilizar um ou outro”, acrescenta Carvalho.
Augusto de Arruda Botelho lembra que “não há qualquer irregularidade ou muito menos crime na divulgação das mensagens”.
Questionado se, na avaliação dele, jornalistas então não podem ser punidos nem investigados, Botelho defende: “Não deveriam. Mas sim, já houve vários inquéritos que jornalistas foram intimados para dar informações sobre matérias publicadas. E eles têm o direito de preservar suas fontes.”
Há histórico de vários precedentes no Supremo Tribunal Federal que resguardam o direito dos jornalistas.
Em um caso recente, de 2021, o ministro Dias Toffoli determinou que autoridades públicas no Espírito Santo abstenham-se de praticar atos que visem responsabilizar jornalistas pela divulgação de um suposto esquema de corrupção envolvendo o Departamento de Trânsito do estado.
Toffoli decidiu que a “plausibilidade do direito alegado e o perigo de dano” consiste “na iminência de jornalistas serem expostos a procedimentos investigatórios criminais que visem à descoberta da fonte e à criminalização de sua atividade”.
Em 2019, uma outra decisão sobre o tema, de um outro ministro, Gilmar Mendes, beneficiou justamente Glenn Greenwald, autor das reportagens da Folha sobre os assessores de Moraes.
Além da jurisprudência e da Constituição, Gilmar ainda defendeu a liberdade de imprensa, citando instrumentos de proteção internacional de direitos humanos, dos quais o Brasil é signatário.
Entre eles, a Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana e o Pacto de San José da Costa Rica.
*Com informações da CNN Brasil
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