Cartório de Votuporanga é investigado por suposto esquema milionário de fraudes

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Cartório de Votuporanga é investigado por suposto esquema milionário de fraudes – Foto: Reprodução

O 1º Cartório de Notas pode ter lesado milhares de usuários, cobrando até o dobro dos valores convencionais. Acusados podem responder por crimes como peculato, estelionato e até formação de organização criminosa.


O 1º Tabelionato de Notas e de Protesto de Letras e Títulos de Votuporanga/SP entrou na mira da DIG (Delegacia de Investigações Gerais) da Polícia Civil que instaurou um inquérito para investigar um suposto esquema de fraudes que pode ter lesado centenas de votuporanguenses e movimentado milhões em dinheiro desviado de usuários e do ‘1º Cartório, da Rua Tietê’ – como é conhecido popularmente. Três funcionários foram afastados de suas funções: Santo Bilalba Júnior, Roseli Barboza Prates e José Gorgato Polizeli.

O caso iniciou com o juiz corregedor permanente, Sérgio Martins Barbatto Júnior, representando criminalmente sobre as supostas ilegalidades substanciado por um ofício da tabeliã interina do ‘1º Cartório, da Rua Tietê’, Gabriela de Oliveira Franco. Conforme o magistrado, o trio abusava da confiança dos usuários do cartório para cobrar valores que poderiam chegar ao dobro do convencional para o registro de escrituras, testamentos ou inventários, dentre outros serviços.

“Isso demonstra uma ilegalidade de oportunidade. Abusa-se da confiança do usuário, cobrando-se valor que poderia chegar ao dobro do devido pelo ato. Caso surgisse algum problema, devolvia-se a diferença ou dela uma parte. E como toda essa operação era feita fora de registro cartorário, nada aparecia nos livros, que eram regularmente lançados e com base em recibos falsos e escrituras desprovidas de mecanismo de fiscalização pela parte”, detalha o trecho da representação assinada por Sérgio Martins Barbatto Júnior.

“Um outro caso, demonstra o prejuízo social causado pelo cartório. O ato notarial da usuária teria, por norma expressa, um desconto de 40%. Aparentemente, porém, isso não só não lhe foi informado, como lhe foi cobrado valor cheio e sem outorga de recibo, o que levaria a crer que o preço fora lançado a menor na escrituração formal”, prossegue o juiz corregedor.

Conforme a representação, em alguns casos, os suspeitos cobravam o “valor cheio” dos usuários pelo ato notarial, mas nos supostos recibos falsos eram lançados como se os usuários tivessem realizado o pagamento com o desconto, que lhe era de direito. Esses pagamentos eram feitos por meio do Pix em contas pessoais dos funcionários, e não do cartório.

Entre os casos apresentados na representação, por exemplo, consta de um aposentado, que efetuou o pagamento de R$ 6,3 mil para a lavratura de um inventário. No entanto, no dia da assinatura do ato notarial, ele e sua filha questionaram os valores e foi informado que havia uma cobrança a mais, “por equívoco”, e que parte do valor seria devolvido (R$2.144,48).

No entanto, para a lavratura do documento, os valores dos recibos arquivados no cartório totalizam R$ 2,1 mil, ou seja, mesmo com a devolução do que teria sido cobrado “por equívoco”, o aposentado ainda teria sido lesado em quase R$ 2 mil. Além disso, o recibo conta com a assinatura do familiar, mas esta não condiz com as assinaturas constantes no livro, ou seja, teria sido supostamente falsificada.

Ação civil pública e bloqueio de bens 

Diante das supostas irregularidades averiguadas até o momento, Sérgio Martins Barbatto Júnior, encaminhou a representação para que o trio seja investigado, já que, segundo o magistrado, constam nos atos potencialmente suspeitos, ou teriam poder gerencial de impor ordem de falsificação de recibos. 

Para além disso, o magistrado representou ao Ministério Público para que possa promover a defesa coletiva dos usuários mediante ação civil pública e para potencial ressarcimento dos prejudicados, em especial mediante bloqueio de bens em desfavor de beneficiários indevidos dos valores injustamente cobrados, bem como avaliar o cabimento e a possibilidade de punir por ato de improbidade administrativa os participantes das ilicitudes apontadas.

Se comprovadas as suspeitas, o trio pode responder por crimes como estelionato, falsidade de documento público, peculato, apropriação indébita e até de formação de organização criminosa.

Diário de Votuporanga procurou a defesa dos investigados, no entanto, até o fechamento desta reportagem, nenhum havia se pronunciado publicamente, permanecendo o espaço em aberto.

O caso segue sob apuração da DIG, que orienta a todos que se sentirem lesados a registrarem boletim de ocorrência para posterior investigação. Ressaltando que, se comprovadas as irregularidades, todas as vítimas poderão entrar com ações de restituição contra o Estado a fim de equiparar os prejuízos.

Associação estadual da categoria se manifesta

Com a repercussão do caso, nesta terça-feira (21.mai), a Anoreg/SP (Associação dos Notários e Registradores de São Paulo), entidade que representa os Cartórios Extrajudiciais do Estado, emitiu uma nota de esclarecimento sobre o caso. Em documento assinado pelo vice-presidente e diretor de assuntos de titulares interinos da Anoreg, Demades Mario Castro, e pela Tabeliã Interina do 1º Tabelionato de Notas e Protesto de Votuporanga, Gabriela de Oliveira Franco, esclarece, entre outros pontos, que a atual tabeliã só assumiu o cartório em 19 de março e, desde então, tem colaborado com a apuração, pelas autoridades competentes, das supostas irregularidades ocorridas em gestões anteriores.

O documento esclarece ainda que todos os investigados não integram mais o quadro de colaboradores da unidade, e que a atual Tabeliã Interina e os atuais funcionários do ‘1º Cartório, da Rua Tietê’ “estão à inteira disposição dos cidadãos e das autoridades, tanto para a prestação dos serviços notariais, quanto para oferecerem as informações e orientações que se fizerem necessárias às partes interessadas.”