Caderno Livre – Poesia que desbota

14
Criança feita de carvão e pó, integrada à natureza, desvanecendo como um retrato esquecido na memória. Uma das obras da exposição ‘Fugaz’. (foto arquivo pessoal)

Exposição ‘Fugaz’, de Chris Jordão, no Museu Edward Coruripe Neto, propõe uma reflexão poética sobre o tempo, a natureza e a impermanência, com obras criadas a partir da luz solar e pigmentos vegetais

 

Chris Jordão é artista plástica, graduada em Farmácia e doutora em produtos naturais. (foto arquivo pessoal)

 

@caroline_leidiane

A artista plástica Chris Jordão convida o público a uma pausa contemplativa em ‘Fugaz’, exposição em cartaz desde o dia 11 que segue até 31 deste mês, no Museu Edward Coruripe Neto, em Votuporanga.

O projeto propõe um mergulho na impermanência, tema que atravessa as obras da artista, e convida à observação sensível do que nasce, se transforma e desaparece.

Com técnicas ancestrais como a antotipia e a fitotipia, Jordão utiliza a luz solar como agente criador, fixando impressões efêmeras sobre papéis, tecidos e folhas.

“Para mim ambas as técnicas são ancestrais e mágicas. A antotipia era o que os botânicos usavam para catalogar espécies na época do descobrimento do Brasil; ambas também são formas primitivas de fotografia. Todo esse processo exige a pesquisa de pigmentos naturais e a paciência de deixar o sol agir sobre as superfícies. O tempo age, a natureza se transforma”, explana a artista.

O relacionamento com o ecossistema vem de longa data.

“Desde a infância tive uma relação muito profunda com a natureza, que resultou em minha formação acadêmica em produtos naturais e agora, como artista plástica, pesquiso como esses produtos podem se transformar em algo que possa impactar visualmente as pessoas e trazer algumas reflexões”, conta.

Essa trajetória fez nascer “Fugaz”, um trabalho que se constrói a partir da observação do tempo e de suas marcas.

“Resolvi dar voz à impermanência e todas as suas nuances: a passagem acelerada do tempo, a nossa falta de tempo para contemplação e ócio, a impermanência da natureza, as pessoas queridas que nos deixaram, o envelhecimento e os ciclos da vida”, retrata Chris.

Em “Fugaz”, o processo é tão relevante quanto o resultado final. Cada obra é atravessada pela ação de pigmentos vegetais, luz, umidade e ar.

“Todo esse processo de pesquisa e desenvolvimento das obras me levam a uma catarse. Toda liberação emocional é expressa em cores, texturas e descolorações”, revela a artista, que encara o próprio desaparecimento das imagens como parte do gesto criativo.

“Esse desaparecimento me impacta. Me faz pensar que todos em algum momento vamos desaparecer e nos transformar em algo novo. A delicadeza das figuras desbotadas dá uma dimensão poética e onírica à exposição”, reflete ela.

A transitoriedade, no entanto, não busca respostas, mas provocações. “Simplesmente não sei te dizer”, diz rindo, ao ser questionada sobre o que espera despertar no público. “Cada indivíduo é um universo de emoções, sentimentos e pensamentos. Cada pessoa irá interpretar de acordo com a sua realidade e experiências prévias.”

“Fugaz” integra o projeto “Memórias Vegetais, Luz e Sombra: Impressões Artísticas com Pigmentos Naturais”, contemplado pelo Edital nº 10/25 – Bolsa Cultura, da Prefeitura de Votuporanga por meio da Secretaria Municipal da Cultura e Turismo. Além da exposição, o projeto levou oficinas de impressão botânica aos quatro Cras (Centro de Referência de Assistência Social) do município, envolvendo cerca de 100 participantes.

“Os atendidos puderam decorar ecobags e telas. Essa atividade trabalhou as memórias vegetais da infância e o sentimento de território dos participantes”, conta a artista.

Em um mundo que tudo parece se esvair rapidamente, “Fugaz” propõe o contrário: um convite para desacelerar, ouvir o tempo e perceber a beleza que habita no efêmero, apreciando a transitoriedade.

 

SERVIÇO

Exposição “Fugaz” de Chris Jordão

Data: de 11 a 31 de outubro

Visitação: terça a domingo, das 09h às 17h

Local: Museu Edward Coruripe Neto, dentro do CIT (Centro de Informações Culturais) “Marão Abdo Alfagali”, no Parque da Cultura

Entrada gratuita