
Em apenas cinco anos, o formato saiu do anonimato, superou o rótulo de tendência passageira e se consolidou como parte essencial da rotina de milhões de brasileiros.
@caroline_leidiane
Era uma vez o rádio. Em tempos não tão distantes, ele era o principal companheiro de jornada de quem pegava trânsito, varria a casa ou precisava se atualizar sobre o mundo. Hoje, esse lugar foi parcialmente ocupado por um novo formato de conteúdo, os podcasts.
Com liberdade de estilo, duração e linguagem, esse formato se espalhou pelas plataformas de streaming e redes sociais como uma nova febre da era digital. Nos últimos cinco anos, o crescimento da audiência, da produção e dos investimentos em podcasts no Brasil revelam algo além da mudança de hábito, é uma transformação cultural em curso.
Segundo dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua) e de levantamentos da PodPesquisa ABPod, o número de ouvintes de podcasts no Brasil dobrou entre 2019 e 2024. Conforme os dados, atualmente são cerca de 31,94 milhões de adeptos. Aproximadamente 40% da população com acesso à internet consome esse tipo de conteúdo com frequência.
O crescimento do formato foi impulsionado por uma combinação de fatores, que vão desde o avanço da internet móvel, barateamento de equipamentos de gravação, surgimento de plataformas dedicadas, até mudanças no comportamento do público.
A variedade é uma das marcas mais fortes desse formato. Há podcasts de curta duração, com episódios de dez minutos, e outros com mais de duas horas. Alguns seguem roteiros detalhados, com ambientação sonora e edição elaborada, enquanto outros optam por conversas espontâneas, quase sempre entre amigos ou especialistas de áreas diversas.
No Brasil, os temas mais populares incluem crimes reais, notícias, entrevistas, cultura pop, psicologia, esportes, espiritualidade e educação. A diversidade de assuntos permite que cada ouvinte encontre seu espaço, seja buscando informação, entretenimento ou companhia durante o dia a dia.
Essa multiplicidade impulsionou o sucesso de produções como Café da Manhã (Folha de S.Paulo/Spotify), que traz notícias do dia com linguagem acessível, Modus Operandi, especializado em true crime, e Mano a Mano, apresentado por Mano Brown, que uniu o rap e o debate político-social em uma só atração.
Ao mesmo tempo, o número de novos programas lançados cresceu vertiginosamente. Muitos deles são independentes, produzidos com recursos próprios e gravações caseiras. Outros contam com o apoio de grandes empresas de mídia e tecnologia, que identificaram no podcast uma nova fronteira de negócios e audiência. Plataformas como Spotify e Amazon Music investiram em produções originais e exclusivas, ampliando ainda mais a penetração do formato.
Essa expansão atraiu também o mercado publicitário. Marcas passaram a apostar no áudio como canal eficiente para alcançar nichos específicos, aproveitando o engajamento de ouvintes que, em geral, acompanham fielmente seus programas preferidos.
Mesmo com o crescimento acelerado, a cena de podcasts enfrenta desafios. A monetização ainda é um obstáculo para muitos produtores independentes, que lutam para se manter em meio à concorrência com grandes estúdios. Além disso, há um debate crescente sobre a responsabilidade editorial dos podcasters, especialmente diante da disseminação de desinformação e discursos de ódio.
Ainda assim, o futuro parece promissor. A tendência é que o podcast continue evoluindo, com profissionalização, cruzamentos com outras mídias, como os podcasts filmados, que fazem sucesso no YouTube, além de formatos mais interativos e personalizados.

Algumas apostas apontam para experiências sonoras imersivas na edição, como a audiossérie de ficção estrelada por Selton Mello e disponível no Spotify, chamada França e o Labirinto. Lançada em 2023 e produzida pelo Jovem Nerd, nela é utilizada tecnologia de áudio binaural que é recomendada ouvir de fones.
Entre os marcos recentes da produção nacional está o podcast A Mulher da Casa Abandonada, criado pelo jornalista Chico Felitti e lançado em 2022. A narrativa conta a história de uma mulher misteriosa que mora em uma antiga mansão, supostamente abandona, no coração da cidade de São Paulo. O jornalismo investigativo de Chico foi tão impactante que a série acaba de ser adaptada para um documentário na Amazon Prime.
Parte do sucesso dos podcasts também está na leveza. É um formato que vai junto com o ouvinte, onde quer que ele esteja. Em um fone no transporte público ou durante uma caminhada, no som do carro, nas caixas conectadas via bluetooth em casa durante tarefas corriqueiras, enfim, o áudio exige pouca atenção e aguça a imaginação.
Essa portabilidade tornou o podcast não só conveniente, mas indispensável para quem quer se informar, aprender ou apenas se entreter em movimento.