Penso que um grande erro que alguém ainda pode cometer, é sentir medo de errar.
Como outros sentimentos e sensações humanas, o medo acaba sendo interpretado por nós como algo negativo, quando na verdade não é, ou pelo menos não deveria ser.
A não ser que a gente coloque o medo simplesmente como o oposto da coragem, aí sim ele é negativo.
Na verdade, não são opostos, com um olhar mais demorado pode ser considerado um o complemento do outro.
Coragem só existe porque existe o medo.
Podemos então concluir que o medo nos é necessário, porque é no desafio do medo que se desperta a nossa coragem.
Veja isso: Dizem que o cachorro não late por coragem, ele late por medo, e o latido dele espanta seu inimigo, marca sua identidade.
Se faço algo sem passar pelo filtro do medo, não posso dizer ter sido um ato de coragem, porque a definição de coragem é agir mesmo com medo.
O contrário de coragem talvez não seja medo, mas sim a covardia, e a consequência do medo não vencido acaba traçando o caráter, porque o medo normalmente é imaginário, agora, a covardia da ação ou da omissão é sempre o caráter mesmo.
Como toda ação que o meio ou outras pessoas provocam em nós, o segredo está na reação.
Lembro de ter visto uma comparação sobre três coisas colocadas sob o efeito da água quente: O ovo, a cenoura e o café.
O ovo é mole, quando fervido em água quente ele se endurece.
A cenoura é toda dura, quando sofre o efeito da água quente quase se derrete de mole.
E o café? Ah o café quando colocado na água quente ele transforma a água.
Vamos imaginar que o nosso medo seja a água quente.
Muitos durões, diante do medo se derretem todo né? Outros muito moles, diante da adversidade que a água quente proporciona, se tornam duros, insensíveis. Outros já olham para essa adversidade, para a crise e enxergam oportunidade. Já o café? Olha para a água e a transforma. Esse perfil de pessoa é o que olha pra aquela água quente, nem vê mais água quente, já vê café.
Taí. Que tal transformar a água quente dos nossos medos em coragem?
E veja o tamanho da incoerência. Porque o provável maior medo que a gente tem, seja de morrer.
Alguns podem não admitir, mas o medo da morte apavora sim a maioria. Acontece que precisamos pensar nos outros medos, aqueles que nos mantam dia a dia.
A covardia provocada pelo medo não transformado em coragem, mata as pessoas a conta gotas. Sabe aquelas pessoas negativas e que justificam suas omissões, suas covardias, pela barreira causada pelo receio ao incerto?
Coragem é agir mesmo com medo, não quero aqui passar uma ideia de inconsequência, o medo também é sim, prudência. Entra aí o bom senso, se o medo me paralisa me bloqueia, poda minha coragem, ele só está sendo nocivo, diferente do medo que me protege de perigos reais, já que todo medo não existe por si, mas pela consequência.
Não temos medo da cobra em si, mas da picada, do veneno da cobra.
E o ápice do medo, é renunciar a liberdade pelo medo das consequências de estar livre.
Se trata como que um medo imperceptível para o medroso, que pensa: Não faço, assim não corro o risco de errar, sem perceber que o não fazer, já pode ser em si o erro, esse é medo que paralisa de verdade.
Olha que o medo nos faz até descaracterizar o verdadeiro sentido do amor de Deus em nós, e isso acaba sendo usado por líderes religiosos.
Pasmem, que preferem provocar no seu rebanho o medo do inferno, de fazer que esse mesmo rebanho sinta o amor do Pastor.
Aliás uma boa pergunta para você agora:
Você procura a Deus pelo medo do inferno ou pelo desejo do céu? Atraído pelo Amor, ou assustado pelo risco da punição?
Pois é, o medo não transformado em coragem provoca desculpas, mentiras, justificativas normalmente derivada de um medo injustificado.
Pra terminar selecionei um trecho da música Metade do Oswaldo Montenegro, onde ele fala do medo:
“Que a força do medo que tenho,
não me impeça de ver o que anseio…
Que a morte de tudo em que acredito
não me tape os ouvidos e a boca…
Que essa minha vontade de ir embora
se transforme na calma e na paz que eu mereço…
E que essa tensão que me corrói por dentro seja um dia recompensada;
Que o medo da solidão se afaste
e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável…
Que o espelho reflita em meu rosto
um doce sorriso que me lembro ter dado na infância…”
Por Carlinhos Marques
Presidente Fundador da Comunidade Terapêutica Novo Sinai, que acolhe dependentes químicos desde 2005 de forma voluntária e gratuita, idealizador do projeto “Sobriedade Já”
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