Por Antoninho Rapassi
Homero enriqueceu a literatura grega do Séc. VIII a. C., ao escrever dois poemas épicos: A Ilíada e a Odisseia. No primeiro livro, o poeta se ocupa em descrever as façanhas do grande herói Aquiles na Guerra de Tróia. A Ilíada é considerada a obra fundadora da literatura ocidental e uma das mais importantes do mundo. Junto com a Odisseia, forma o modelo pronto e acabado da poesia épica.
A Ilíada se passa durante o décimo ano da Guerra de Troia e destaca a ira de Aquiles. Ira causada por uma disputa entre Aquiles e Agamenon, comandante dos exércitos gregos em Troia. Aquiles era filho da deusa marinha Tétis e do mortal Rei Peleu. Portanto, Aquiles era príncipe de Ftia, líder dos Mirmidões e considerado um grande herói e o melhor de todos os guerreiros. O estopim do desentendimento entre Aquiles e Agamenon se deu quando este tomou daquele, a escrava Briseis ou Briseida.
Ulisses, versão latina do nome Odisseus, era Rei de Ítaca: um guerreiro astuto e ardiloso. Frequentemente fazia o papel de apaziguador entre Aquiles e Agamenon. Foi de Ulisses que partiu a ideia de se fazer o cavalo de pau, conhecido pelo nome de “Cavalo de Troia” – uma armadilha surpreendente que derrotou os troianos e consequentemente tornou-se um proverbial recurso usado para se obter a destruição desejada sob a aparência de um belo presente. Viralizou como sendo o perigoso “presente de grego”. A Odisseia narra em cerca de 12 mil versos as aventuras de Odisseus ou Ulisses, marido de Penélope, pai de Telêmaco e dono do cachorro Argos.
Terminada a Guerra de Troia, Ulisses enfrenta durante mais 10 anos, mitológicos desafios em terra e nos mares para, finalmente retornar à Ilha de Ítaca, onde sua fiel esposa engambelava os pretendentes à sua mão iludindo-os com a sutileza de duas urdiduras: a primeira delas consistia na tessitura manual de um tapete feito por ela. Se Penélope terminasse o tapete ela teria que se casar e, certamente o noivo era um inimigo de Ulisses, um inimigo dela, por extensão. O progresso que Penélope alcançava durante o dia, desmanchava-o à noite quando não havia olhares fiscalizadores dos grupos interessados na escolha do novo marido para a rainha. E essa era a segunda sutileza urdida pela rainha.
Quem primeiro reconhece o herói Ulisses ao pisar no solo de Ítaca, é o seu cão Argos que se manifesta ostensivamente além das frenéticas oscilações do seu rabo, mas também com uma alegria incontida, apesar do disfarce de mendigo no qual Ulisses tomou o cuidado para não ser reconhecido pelos seus adversários políticos. Se todas as pessoas tivessem um coração igual ao de um cão, os homens seriam mais felizes, penso eu.
Com a decisiva ajuda de Argos é que Ulisses foi conduzido até ao local onde se encontrava o seu único filho, Telêmaco. O festejado encontro marcou o início das táticas que, postas em prática resultaram na retomada da posse de Ulisses no trono da famosa Ilha. Mais uma vez ficaram comprovados os recursos de estrategista militar que Ulisses possuía, pois sabia escolher onde, como e quando travar as batalhas que lhes deram vitórias e o domínio inconteste do seu reinado no pós Guerra de Troia. Ulisses é na História da Civilização detentor das maiores e mais hiperbólicas coleções de apelidos que o tornam um mito ou em um herói carregado de fascínios. Ulisses acabou sendo tomado como patrimônio cultural português, vejam só. A fundação da cidade de Lisboa, originariamente chamada de “ULISSEUM” ou “OLISIPO” é atribuída ao guerreiro protagonista de Homero no livro épico “Odisseia”. Sim, Ulisses antes do retorno a Ítaca, teria navegado pelo Atlântico e ancorado nas águas do Tejo. Esta história ficcional se apoia nas lendas da Mitologia grega e, foram de grande serventia para que o povo português dela se apropriasse para fazer valer o instinto lusófilo por tudo o que é grandioso e que redunda em símbolo do seu sentimentalismo e vocação incorrigível pela saudade, eternizada nos corações e nos fados chorosos. Isto tudo está arraigado na alma e na forma de viver do indômito povo da Lusitânia, parceiros imaginários de Ulisses no tocante ao enfrentamento dos mares “nunca dantes navegados”, bem como no desbravamento de terras d´além mares.
Na literatura, e injusto seria minimizar os cantos poéticos de Camões e de Fernando Pessoa, quando eles exaltaram as destemidas conquistas fossem em terra fossem nos mares, do Rei de Ítaca. Também é lamentável não comentar agora e aqui, as façanhas de Ulisses quando enfrentou o gigante de um olho só, chamado Polifemo, que habitava a Ilha dos Cíclopes – onde todos os monstros tinham um só olho no meio da testa. Lamentável deixar sem maiores informações o capítulo de Ulisses e o Canto das Sereias, canto mortífero, por sinal.
Peço vênia ao maior poeta da língua portuguesa, Camões, para, em substituição ao Canto III de “Os Lusíadas” optar pela transcrição dos inspirados (pleonasmo) versos de Fernando Pessoa, que reforça e como, a importância de Ulisses na História de Portugal:
“O mito é o nada que é tudo. O mesmo sol que abre os céus É um mito brilhante e mudo – O corpo morto de Deus, Vivo e desnudo.
Este, que aqui aportou, Foi por não ter existido. Sem existir nos bastou. Por não ter vindo foi vindo E nos criou.
Assim a lenda se escorre A entrar na realidade, E a fecundá-la decorre. Em baixo, a vida, metade De nada, morre”. (Fernando Pessoa)
- 27 de Setembro de 2020, dia do 93º Aniversário do Professor Benedicto Silva, a quem dedico, com justo orgulho, este modesto trabalho. Antoninho Rapassi.