Professores na era dos 15 segundos 

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Alberto Martins Cesário, professor e escritor - Foto: Reprodução

Alberto Martins Cesário, professor e escritor

A sociedade atual se caracteriza por uma aceleração da informação, e as crianças e jovens são os protagonistas dessa nova era. O mundo gira em torno dos 15 segundos de um vídeo no Instagram, do “story” do Snapchat ou de uma postagem no TikTok. Se, por um lado, essas plataformas permitem a democratização da comunicação e o acesso a conteúdos diversos, por outro, elas impõem um ritmo frenético que, muitas vezes, esgota a atenção e a capacidade de reflexão dos mais jovens. Nesse cenário, como podemos, enquanto educadores, formar leitores críticos e cidadãos conscientes? 

O papel do professor nunca foi tão complexo. Em tempos passados, os desafios pedagógicos eram, de certa forma, previsíveis: métodos de ensino mais tradicionais, pautados em livros, quadros-negros e roteiros de aula bem definidos. Hoje, no entanto, a tecnologia altera constantemente esse cenário. As mídias sociais, com seus vídeos curtos e interatividade, criam um ambiente propício à superficialidade. Os alunos chegam à sala de aula acostumados a consumir informações em doses pequenas, rápidas, e de maneira fragmentada. Se antes, o hábito de ler envolvia a dedicação a um livro por semanas, hoje a leitura tornou-se algo esporádico, reduzido a frases curtas e “ganchos” que nos chamam a atenção apenas pelo que é imediato. 

Como, então, ensinar a importância da leitura profunda, da compreensão crítica, quando as ferramentas ao redor estimulam a pressa e a efemeridade? 

A tarefa do educador de formar leitores se tornou um desafio árduo, pois não envolve apenas o ato de ensinar a decodificação das palavras, mas o de proporcionar aos alunos uma experiência transformadora com o texto. Isso exige que o educador seja não apenas um mestre das letras, mas um gestor da atenção, um curador de experiências. É necessário despertar nos alunos o prazer pela leitura em um mundo em que a cultura da rapidez parece ser a norma. Por mais difícil que seja, este é um caminho sem volta. O professor precisa ser criativo, paciente e, acima de tudo, resiliente. 

Mas tem algo que torna esse cenário ainda mais desafiador, o fato de que o professor, muitas vezes, se encontra sozinho nessa tarefa monumental. O sistema educacional exige resultados, mas não oferece as ferramentas adequadas para o educador fazer seu trabalho de forma eficaz. O professor está frequentemente sobrecarregado, com classes numerosas, currículos extensos, e uma infraestrutura precária. Além disso, ele enfrenta um cenário onde, além de ensinar conteúdos, é necessário lidar com problemas emocionais e comportamentais de seus alunos, muitos dos quais não têm suporte em casa. 

Nos dias de hoje, o comportamento de muitas crianças reflete uma falta de limites que se estende para além das paredes da escola. A educação, que deveria ser uma extensão do lar, muitas vezes não encontra respaldo nas famílias. A ausência de um acompanhamento próximo por parte dos pais agrava ainda mais a situação. Muitos professores têm se deparado com situações de desrespeito e indisciplina em sala de aula, que não são confrontadas ou corrigidas em casa, criando um ambiente de tensão e insegurança. 

Esse é um ponto crucial: como exigir que os alunos tenham um comportamento adequado se, muitas vezes, o exemplo em casa é ausente ou até prejudicial? O que se vê é uma geração que cresce sem entender o significado de “respeito”, “limite” e “responsabilidade”, conceitos fundamentais para o bom funcionamento da convivência escolar e social. 

Para o professor, essa ausência de limites e de apoio das famílias se traduz em um custo emocional altíssimo. Estar diante de alunos indisciplinados, desinteressados ou emocionalmente desgastados, sem o devido suporte, pode ser extremamente desgastante. Muitos professores têm enfrentado problemas de saúde mental, como estresse, ansiedade e até depressão. A pressão para lidar com essas situações sem um acompanhamento adequado torna-se cada vez mais difícil, levando ao esgotamento físico e psicológico. E o mais doloroso: quando o professor sucumbe à pressão, a sociedade muitas vezes não reconhece o quanto ele foi fundamental para a formação do aluno. A falta de valorização da profissão é um tema recorrente e urgente. 

É impossível falar sobre os desafios da educação sem tocar na questão da valorização dos professores. Não basta apenas reconhecer o esforço dos educadores com palavras vazias, é preciso agir. O sistema educacional precisa garantir condições adequadas de trabalho, tanto em termos de infraestrutura quanto de recursos pedagógicos. No entanto, a realidade é cruel: o professor continua sendo um dos profissionais mais mal remunerados e, frequentemente, mais negligenciados pela sociedade e pelos governantes. 

Se a educação é a chave para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e igualitária, então devemos começar a olhar para os professores com o devido respeito e dignidade. Valorizar o trabalho dos educadores não é apenas uma questão de aumentar salários – embora isso seja uma parte essencial da solução. A valorização verdadeira se dá no reconhecimento do seu papel fundamental na formação dos indivíduos e na construção do futuro da sociedade. A saúde emocional dos professores precisa ser uma prioridade, e as condições de trabalho devem ser constantemente monitoradas e melhoradas. 

Mais do que nunca, é necessário investir na formação contínua dos educadores, proporcionando a eles o suporte necessário para enfrentar os desafios emocionais da profissão. Programas de apoio psicológico, espaços para troca de experiências, e um ambiente mais colaborativo nas escolas são medidas que podem ajudar a aliviar a pressão diária que os professores enfrentam. 

A tarefa de formar leitores e cidadãos críticos na era das mídias sociais é, sem dúvida, um desafio enorme. No entanto, ela não é impossível. Como educadores, precisamos estar dispostos a lutar por uma educação que vá além da simples transmissão de informações. Devemos ser capazes de cultivar nos alunos o amor pela leitura, o prazer pelo conhecimento e a capacidade de refletir sobre o mundo em que vivem. 

Para isso, é necessário mudar o foco da educação: não devemos ser apenas transmissores de conteúdo, mas mediadores da experiência do aluno com o mundo. Precisamos ir além da superficialidade da leitura rápida e oferecer experiências que despertem o pensamento crítico, a reflexão profunda e, claro, a capacidade de analisar o mundo com olhos mais atentos. 

Além disso, a valorização dos educadores é essencial. Não podemos continuar permitindo que nossos professores enfrentem adversidades sem o devido reconhecimento. O que está em jogo é o futuro de nossas crianças e a qualidade da educação que será transmitida a elas. A transformação começa com ações concretas e uma mudança de mentalidade. Se queremos que nossos alunos se tornem leitores e pensadores profundos, devemos começar pelo básico: cuidar dos nossos professores, garantir que eles tenham o apoio e os recursos necessários, e dar-lhes o espaço para respirar e inovar. 

No fim, a educação é um processo de transformação mútua: o educador transforma o aluno, mas o aluno também transforma o professor. E, ao transformar cada um deles, transformamos toda a sociedade. Não podemos mais esperar que a mudança aconteça sozinha. A mudança começa agora, com uma ação consciente, deliberada e cheia de esperança.