Por Antoninho Rapassi
Nunca li e nunca soube se alguém escreveu sobre a existência do campo de aviação de Votuporanga, que provavelmente surgiu em decorrência do término da 2ª guerra mundial, em 1945. O que sei é que o surgimento da aviação no Brasil remonta ao início do século XX, quando foi criado o primeiro aeroclube em nosso país. Precisamente, em 1911. Recordem que somos o país onde nasceu o Pai da Aviação, Alberto Santos-Dumont, e o seu primeiro voo foi no icônico 23 de outubro de 1906, em Bagatelle na região da torre Eifell em Paris, capital da França.
Na campanha eleitoral de 1950 que acabou por eleger o Professor Lucas Nogueira Garcez, como governador do estado de São Paulo, com o decidido apoio de Adhemar de Barros que encerrava o seu quatriênio colhendo entusiástico apoio popular.
Desde quando, no Estado Novo (1937 a 1945), o ditador Getúlio Vargas indicou o médico Adhemar de Barros como Interventor paulista, nenhuma pessoa poderia prever o tamanho volume de obras de infraestrutura que o chefe do Partido Social Progressista iria beneficiar todo o estado de São Paulo.
Obcecado pela ideia de chegar à presidência da República, sucedendo a Getúlio Vargas, Adhemar usava do seu avião particular a fim de estar, com frequência em todos os quadrantes do nosso estado e também do Brasil.
Por ter sido pela sua acertada decisão, fazer com que os trilhos da Estrada de Ferro Araraquara, há tempos parados em Mirassol, seguissem no sentido de Votuporanga até chegarem à Rubineia, as manifestações de agradecimento se repetiam sem parar. Visitando assiduamente o interior paulista, o Dr. Adhemar conquistou vitórias com a maioria dos prefeitos nas eleições de 1952.
Foi quando ele veio a Votuporanga para comemorar com o seu amigo, Capitão Leônidas Pereira de Almeida. Neste preciso dia, pelas mãos do meu pai fui ao campo de aviação pela primeira vez.
Vejam o que aconteceu: em frente ao hangar estava estacionado um avião Douglas DC3, bimotor, que havia trazido o grande chefe político e sua comitiva. Muitas crianças e adultos protegiam-se do sol, disputando as sombras da aeronave. Do interior da caminhonete do meu pai, vi ao longe um avião tão grande e, na verdade, confesso ter sentido medo daquele estranho, mas imponente objeto alado.
Naquele decênio, ou seja, no decorrer dos anos 50 a nossa pujante Votuporanga passou a ter também a frequência de duas companhias aéreas, ligando-nos com a capital do estado. As companhias aéreas eram a “Real Aerovias Nacional” e a outra a “Cruzeiro do Sul”.
No final das tardes e em dias alternados eu ficava aguardando, ansiosamente o ronco do avião que sobrevoava a cidade e depois pousava na pista de terra do nosso campo de aviação. Menino curioso e sentindo muito orgulho daquele serviço de navegação aérea entre nós, muitas vezes fui assistir ao pouso da aeronave e ao desembarque dos passageiros e da própria tripulação, que eram quatro ou cinco pessoas, garbosamente envergando o uniforme da respectiva companhia.
Em terra trabalhava sempre esbaforido, o chefe do escritório de representação das duas companhias aéreas, o jovem apolíneo, simpático e nosso conterrâneo Denizard Vidigal, que envidava o máximo esforço físico e mental no desempenho das intrincadas atividades burocráticas, tanto na chegada como, no dia seguinte, já às 06:00 horas da manhã, na partida da aeronave com a papelada em ordem. Uma tarefa somente realizada por quem era realmente um gigante.
A tripulação servia-se de taxi para ir ao hotel e os passageiros dividiam-se entre taxis e com os automóveis próprios, enquanto o último a deixar o campo de aviação era o Denizard Vidigal. Quanto à segurança do aparelho havia a figura do guarda-campo, o “seu” Pires que ficava madrugada adentro, sem nunca ter sido importunado por ninguém.
O hangar tinha uma grande porta de correr sobre trilho e no seu interior ficava estacionado o avião “Paulistinha” de prefixo PP-RXB sempre pilotado pelo Vicente Lupo nas tardes quentes e preguiçosas. No espaço amplo do hangar, recordo-me de ter visto mais de um monomotor ali estacionado sobre o chão de terra batida.
E por falar em recordação, vale registrar o episódio daquela tarde de 11 de agosto de 1953, quando o heroico piloto Vicente Lupo, sentindo a iminência de fatídica pane ao sobrevoar o centro da cidade de Votuporanga, controlou seus nervos e executou com absoluto êxito um pouso inimaginável com o seu monomotor PP-RXB, no curtíssimo espaço de um caramanchão de primaveras vermelhas do jardim público, onde hoje temos a nave principal da nossa Basílica.
Agora, considerem com que habilidade o sagaz Vicente Lupo evitou o choque contra o telhado do prédio assobradado da prefeitura municipal, a poucos metros tendo à frente e há alguns metros abaixo, o pavilhão diminuto da trepadeira escarlate do jardim.
Assim foi que o milagre aconteceu sob os olhares estarrecidos dos que testemunharam o surgimento da figura mítica de Votuporanga, nascida e criada em nosso campo de aviação, que saiu ileso do nosso primeiro e único contratempo aviatório, por isso merecedor legítimo do adjetivo latino “invicto”. Deo Gratias!
29 de Fevereiro de 2024