O filósofo Luís Felipe Pondé participa de um programa semanal chamado “Linhas Cruzadas”, exibido semanalmente às quintas-feiras pela TV Cultura.
O episódio exibido no dia 27 de julho de 2023, disponível no Youtube, foi intitulado de: “Quem as bigtechs ameaçam?”. Quando o assisti, concordei com alguns pontos, mas achei que as ameaças diagnosticadas ainda estariam longe de ocorrer.
Pondé coloca dois pontos liberais clássicos para sua análise: o Estado detém o monopólio da violência e o monopólio da emissão de moedas. O primeiro aspecto pode ser atacado pela falta de credibilidade nas instituições do Estado, o segundo, pela emissão de moedas sem Bancos Centrais, como as bitcoins.
Foi tema desta semana a investida do trilionário proprietário do Tweeter (X), Elon Musk, sobre a atuação do Ministro Alexandre de Moraes no inquérito das fake News, em processamento no Supremo Tribunal Federal, reverberando a nível mundial às falas do ex-Presidente Bolsonaro e de outros representantes da Direita ditatorial global.
É certo que – e o tema foi objeto de pesquisa do meu mestrado em Direito – os Estados nacionais como conhecemos, os quais foram consolidados desde a Paz de Westfália de 1648 após a Guerra religiosa dos 30 anos, vêm sendo modificados pelo longo desses quase quatro séculos.
As informações, mercadorias, notícias, capital financeiro, bitcoins e a macrocriminalidade se sobrepõem às fronteiras políticas dos países e isso tem reflexo na soberania dos Estados, na sua economia e nas suas leis.
Por exemplo, como se combater penalmente a fuga transnacional de capitais para paraísos fiscais e jurídicos se o país só pode “mandar”, com base em sua soberania, dentro de suas fronteiras?
Como combater o ataque à credibilidade dos Estados que ainda são democráticos? Pois é certo que os Estados que são realmente ditatoriais não sofrem ataques de Musk.
A mesma lógica se aplica aos crimes ambientais, que afetam nossa “casa comum”, como disse o Papa Francisco em sua encíclica Laudato Si: o vilipêndio do ar, da terra, das florestas e das águas afeta todo o globo e como fazer para que um outro país seja obrigado a cuidar dos seus bens naturais?
O país que se vê obrigado a fazer isso, diz que tem sua soberania e que ninguém pode interferir em seu território, esta é a ordem mundial. E isso ocorre porque não há um Estado Mundial e um governo global que paire sobre todo o globo. As ordens internacionais são de soft power.
Mas parece que Elon Musk se arvorou no papel de hard Power, e após ter pago 44 bilhões de dólares pelo Tweeter, possui em suas mãos uma ferramenta global de influência política, que se acha capaz de “colocar o dedo” na cara de qualquer país.
Economicamente, diz-se que Musk vem atacando o Brasil não apenas pela sua ideologia totalitária, mas também porque o Brasil se tornou produtor do BYD, carro elétrico concorrente do seu Tesla.
Há argumentos para todos os lados da discussão e as posições vêm se enrijecendo a nível global.
Dinheiros, ordens judiciais, respeito a autoridades e instituições só se mantêm fundadas na crença: se todos sacarem o que têm em suas contas correntes, o banco quebra, pois não têm lastro de todo seu capital. O mesmo se passa com as leis e as decisões judiciais.
Faz parte da liberdade de expressão tolerar o intolerante?
Eu ainda acredito na argumentação e na defesa coerente de ideias. O que não é possível é a defesa da liberdade global ao mesmo tempo que se flerta com ditaduras como faz Musk.
Bruno Arena: Mestre em Direito Penal e Humanos pela Universidade de Salamanca (Espanha). Especialista em direito penal e direito eleitoral. Presidente do Rotary Club Votuporanga 2022/23. Vice-Presidente da ACILBRAS. Membro do Observatório da Democracia. Proprietário do Cine Votuporanga. Autor e tradutor de livros. Advogado. Instagram @adv.brunoarena.