Pérola Ferraz
“Numa disputa eleitoral, há duas tarefas: assegurar o apoio dos amigos e ganhar o do público. Você ganhará o dos amigos com gentilezas, favores, conexões, disponibilidade e charme. Faça-os saber que, se você ganhar a eleição agora, estará em dívida com eles. Não se deve filtrar aliados pelo caráter. Numa campanha, você não deve ter vergonha de cultivar amigos dos quais nenhuma pessoa decente se aproximaria.
A segunda parte da campanha deve tratar de ganhar o povo. O primeiro passo é conhecer as pessoas pelo nome. Entretanto, apenas chamar os eleitores pelo nome não basta. Eles precisam saber o que vão ganhar com sua eleição. Por isso, não se deve ter o pudor de prometer, ainda que mais tarde seja necessário convencer os eleitores de que não foi possível cumprir o prometido. O mais prudente é ser vago em relação às promessas. Dizer aos nobres que manterá seus privilégios, aos empresários que assegurará a estabilidade de seus negócios e ao povo que sempre esteve e estará ao seu lado. A parte mais importante da campanha é levar esperança às pessoas e atrair seus bons augúrios. A política é cheia de falsidade, deslealdade e traições.
Parece atual este texto, não é mesmo? Todavia, ele é um manual que foi escrito em 64 a.C por Quintus Tullius Cicero e endereçado a seu irmão, Marcus Cicero. Continha uma série de estratégias que deveriam ser adotadas em uma campanha política bem-sucedida.
A política sempre existiu, mas ainda não era tão requintada como hoje. Ela começou a se transformar, principalmente depois que os homens começaram a se organizar em sistemas sociais. Ao longo da História, o homem desenvolveu vários formas de governo. A República, por exemplo, sistema que foi adotado pelo Brasil em 1889, surgiu na Roma Antiga e seu principal significado é: “Coisa Pública”. Isso porque deveria ser uma forma de governo que atendesse às necessidades e os anseios do povo.
Estamos vivendo um período muito importante para a política brasileira: as eleições municipais! Muitos podem até pensar: “E eu com isso?” Mas é na cidade que se sente o poder. Em cidades pequenas como a nossa, é possível que o prefeito conheça as pessoas, é possível que o vereador também as conheça e que o poder exercido por eles atinja muito mais você e a sua família, do que o poder de um governador ou do próprio presidente. Os vereadores e o prefeito estão nas ruas, a eleição municipal é feita por gente que você conhece e que pode ajudar a resolver os problemas diários que assolam não somente você e a sua família, mas também, toda a sua comunidade. A cadeira poder sempre está ocupada e, se você resolver não participar, vai ter que obedecer mesmo assim! Quem não pensa conscientemente sobre isso, acaba deixando nas mãos dos outros coisas que dizem respeito ao seu cotidiano, como o asfaltamento da sua rua, os gastos prioritários do município, onde e como as verbas devem ser gastas e como o seu filho vai ser educado na escola pública.
Precisamos pensar muito bem e analisar todos os candidatos, suas histórias, seus projetos e saber diferenciar se, de fato, são mesmo projetos ou apenas palavras de ordem. Não basta acreditar que, após o ato de votar, tudo está acabado, porque não está! É importante acompanhar o mandato do candidato eleito e o desenvolvimento de suas propostas.
Se ele não estiver cumprindo, é necessário cobrar, mandar mensagem e estar atento. Mas, se estiver, deve ser elogiado e é sempre bom deixar claro que você está ali, cumprindo com seu papel de eleitor, que não acaba com a campanha eleitoral.
Se assim não fizermos, estaremos deixando que o texto escrito por Quintus Tullius Cicero há mais de dois mil anos em Roma continue atual, marcado por um cenário estigmatizado pela sede de poder, falsas promessas, doações escusas para campanhas, escândalos e corrupção.
- Camila Pérola Ferraz é professora de História e vice-diretora da Escola SAB