Bruno Arena –
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Peço desculpas pela pausa necessária na sequência de takes sobre Direito e Cinema, mas o assunto é de relevância ao nosso município: a tentativa de instituição da taxa do lixo (o correto seria TRS – taxa de resíduos sólidos) por meio do Projeto de Lei Complementar número 13 proposto pelo Poder Executivo municipal.
Como tive a oportunidade de dar um parecer jurídico acerca desse projeto e como esta coluna tem um objetivo didático-jurídico-cidadão de esclarecimento, vou explicar a normativa e os conceitos jurídicos que envolveram esta votação na sessão do dia 04 de outubro de 2021.
A distinção primeira que deve ser feita é entre os termos em título desta coluna, todos distintos entre si: a definição de tributo está no artigo 3º do Código Tributário Nacional e, em linguagem não jurídica, é o que o Estado nos obriga a pagar por meio de leis e que não pode ser uma punição, como as multas de trânsito, por exemplo.
Ou seja, tributo é um gênero de prestação em dinheiro ao Estado e que possui algumas espécies, são elas: impostos, taxas e contribuições de melhoria. Para nossos objetivos, vou deixar de lado a discussão doutrinária acerca de haver ou não mais duas espécies tributárias (empréstimos compulsórios e contribuições especiais). Correto é que os principais tributos são os impostos e as taxas.
Os impostos são um tipo de tributo pagos pela simples existência do poder estatal. Como assim? Em regra, o poder público (poder executivo municipal, poder judiciário, poder legislativo, etc.) não existe para que sua atividade gere lucro, mas para administrar o interesse público da coletividade e para manter essas atividades há um custo, saldado com impostos.
Por isso é um erro técnico dizermos que se pagamos IPVA (imposto sobre a propriedade de veículos automotores), as estradas devem estar sem buracos, porque o que gera a obrigação de pagar esse imposto é o fato de se possuir um veículo automotor em uma sociedade organizada pelo poder público. Paga-se por possuir esta riqueza em determinada comunidade. O Estado não está obrigado a reverter os impostos em serviços, este seria o papel das taxas, que estão definidas pelo artigo 77 do Código Tributário Nacional.
Se os fiscais municipais, estaduais ou federais exercem o poder de polícia nas suas fiscalizações, este serviço é pago por taxas; se um serviço público é prestado, quer seja diretamente pelo poder público, quer seja por meio empresas contratadas, este serviço é custeado por taxas.
Mais um conceito a que devemos nos atentar: desde a reforma administrativa da década de 90, busca-se uma administração pública mais gerencial, com mais controle fiscal e rastreabilidade dos dinheiros que entram e saem dos cofres públicos. Nesse sentido é que a Lei federal 14.026 de 2020 estipulou em seu artigo 29, inciso II a necessidade do equilíbrio econômico-financeiro do serviço de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos: “art. 29 Os serviços públicos de saneamento básico terão a sustentabilidade econômico-financeira assegurada por meio da remuneração pela cobrança dos serviços; II – de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos na forma de taxas, tarifas e outros preços públicos”. E aqui vemos aparecer mais um conceito que necessita da nossa explicação: tarifa.
Qual a diferença entre as taxas e as tarifas? As taxas, como já dissemos, são espécies de tributos e, como tais, precisam de uma lei que autorize sua cobrança, por isso o Projeto de Lei Complementar Municipal nº 13/2021. Ou seja, fazem parte de algo que, em Direito, chamamos de regime jurídico de direito público.
As tarifas (ou preços públicos) são uma modalidade de remuneração de serviços públicos muito semelhantes às taxas, pois há também para elas exigências de contraprestação e referibilidade, mas se distinguem pelo regime jurídico, que é privado. São exemplos: energia elétrica e água.
Mais uma informação, no nosso município, conforme informações apresentadas pela SAEV na audiência pública do dia 29 de setembro na Câmara dos Vereadores, o serviço da coleta de lixo é pago pelas receitas das tarifas da água e do esgoto, o que está incorreto de acordo com um julgado antigo (de 1980) da nossa Suprema Corte. E não pode ser assim porque, como já dissemos, se as receitas e custos dos serviços estão misturados fica difícil sua administração e aferição do equilíbrio econômico-financeiro.
Qual solução foi então apresentada por alguns vereadores, porém não acatada pelo poder executivo? Colocar na “caixinha” da taxa do lixo o que hoje está misturado na água e no esgoto, não aumentando a carga tributária geral paga aos munícipes, do contrário haveria um reajuste indireto dessas tarifas. Porém não houve emenda ao projeto e o resultado foi 11 a 3 contrário à instituição.
Agora restará ao poder executivo escolher entre assumir o ônus político do aumento de arrecadação (8 milhões por ano) por meio da criação de uma nova tarifa ou se vai simplesmente cumprir a lei federal 14.026/2020 sem onerar mais o munícipe. Aguardemos o pós-feriado.