DEVER E PODER

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O último artigo rendeu um comentário bastante interessante por parte de um leitor e gostaria de dividir com vocês essa afirmação. Após os elogios quanto ao texto, o trecho seguinte da mensagem trouxe a expressão “por outro lado”, trazendo um aporte contraditório sobre o empoderamento da pessoa sobre suas próprias escolhas, demonstrando uma visão bastante séria e centrada sobre a vida.

“[…] Por outro lado, não acho que podemos tudo e que basta se empoderar, já que estamos condicionados pelas nossas próprias capacidades e contingências do meio”.  É óbvio que lancei mão do coraçãozinho quando vi essa mensagem. Usuários do whatsapp sabem do que estou falando.

Esse trecho da mensagem tocou, imediatamente, meus pensamentos, uma vez que trouxe para o contexto um conectivo de causa “já que”. Sabemos que a língua portuguesa traz, em seu conteúdo, a análise sintática das orações, bem como as relações de sentido que elas estabelecem entre si. Ao observar a conjunção, logo pensei em Pablo Neruda.

Sim, minha cabeça dá voltas antes que eu chegue aos “finalmentes”.

Para contextualizar, Pablo Neruda foi um famoso escritor chileno. Autor dos mais lindos poemas escritos em língua espanhola, lidos e traduzidos no mundo todo. Começou sua carreira escrevendo artigos para um jornal local, assim como essa autora que vos escreve aqui. Será que alcançarei tal feito? Ahhh, acho difícil nos tempos atuais, mas, conforme meus textos anteriores, não posso fugir à defesa desse empoderamento.

Voltando à resposta do leitor, as duas condicionantes merecem ser argumentadas, tal qual em uma redação do Enem, quando colocamos na introdução as perspectivas que serão desenvolvidas ao longo do texto, antes da proposta final. São elas: nossas próprias capacidades e contingências do meio.

O conceito de capacidade está presente em várias áreas do conhecimento humano e refere-se à aptidão e à habilidade de um indivíduo em aprender, fazer, desenvolver ou desempenhar algum conhecimento ou atividade. Nesse viés, todos estamos propensos a aprender algo novo, ou ainda fazer reviver uma habilidade adormecida pelas intempéries da vida. Logo, o termo “nossas próprias capacidades” traz à tona algo inato que não só pode, mas também deve ser desenvolvido pelo indivíduo, pois está intrínseco.

Ademais, as “contingências do meio” nos forçam a rumos inesperados na caminhada da vida. Esse fator permeia todos os acontecimentos, uma vez que consiste na relação de dependência entre os eventos, a chamada causa e consequência. Dessa forma, cada ação gera uma reação, e o resultado nem sempre é o esperado. Ainda assim, é importante frisar que se não houver uma ação por parte do indivíduo, se ele permanecer inerte diante da vida, nada nem ninguém poderá carregar a chaga do “e se”, a não ser ele próprio. A vida, portanto, exige movimento e determinação diante dos propósitos maiores. Para tal, percebe-se a necessidade do autoconhecimento como forma de preparação das escolhas e dos caminhos a serem permeados. Nada pode ser feito na impulsividade do momento, mas também não pode esperar a ação do tempo ou que o meio lhe beneficie de alguma maneira.

Então, voltamos à citação mais famosa do meu poeta favorito. “Você é livre para fazer suas escolhas, mas é prisioneiro das consequências” (Pablo Neruda). Essa frase pode ainda ser corroborada com uma outra do filósofo Immanuel Kant “Liberdade não é fazer o que se quer, mas fazer o que se deve”, trazendo à luz da consciência a necessidade de agir racionalmente. Portanto, o empoderamento pessoal não deve ser percebido como a possibilidade de agir pensando apenas nos próprios desejos, mas sim como a capacidade de escolher seu destino de maneira racional e consistente, levando em consideração seus saberes e seus aprendizados, mas, acima de tudo, a consciência de que nada é estático e inflexível.

Por fim, o que não podemos jamais é aceitar calados e imóveis aquilo que nos aflige, haja vista que daremos o poder de decisão para os outros. Por outro lado, não podemos chutar o balde diante de qualquer adversidade, sob a ótica de parecermos inconsequentes e irresponsáveis. A palavra-chave é EQUILÍBRO entre o poder e o dever.

Alexandra A.S. Fernandes: Graduada em Letras – Português/Espanhol pela UNIP. Pós-graduada em Metodologia de Ensino das Línguas Portuguesa e Espanhola pela UCAM. Autora do livro – Autismo – Ensinar aprendendo e aprender ensinando. Diretora Social e Acadêmica da ACILBRAS. Funcionária pública e Professora de Análise Linguística do Piconzé Anglo e HF Cursos Jurídicos. Escritora, Terapeuta Integrativa, Astróloga e Artesã.  Redes sociais: Instagram @profa_alexandra e @aora_terapias; Youtube Profa. Alexandra – Tirando dúvidas de português.